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Quem muito corre, não trabalha - agita-se

Diariamente, ouvem-se pessoas que, em tom de lamento, dizem-se a correr, que têm pouco tempo, que não conseguem tirar um tempito para si mesmas e, muitos outros, chegam ao ponto de dizer que não têm tempo para estar hospitalizadas ou nas celas de uma prisão.

As irmãs Marta e Maria, dos evangelhos, receberam o Nazareno para almoçar em sua casa. Marta, afadigou-se com o almoço, com o possível bom aspecto das instalações e sua irmã, Maria, aconchegou-se junto do Mestre e guardava no seu coração tudo o que Ele dizia.

Então Marta, pediu ao Mestre que sua irmã estivesse mais disponível para ser ajudada. O Mestre disse-lhe: “Maria escolheu ouvir a palavra de Deus – escolheu a melhor parte, enquanto tu andas afadigada, sem tempo”. (Lucas, 10 – 38,42).

Vivemos num tempo, sem tempo. Todo o mundo vive a correr. E quem muito corre, não trabalha – agita-se.

Quem recordar o que se fazia no tempo da primeira metade do século passado, conclui que todos tinham tempo para tudo e para todos.

Satisfeitos ou não, com trabalho agradado ou de circunstância, todo o mundo trabalhava e buscava-se a perfeição e o artista procurava brilhar. Logo, não podia haver correrias, havia método e seriedade.

Está tudo mudado. O capitalismo selvagem não pára de correr e de fazer correr.

Correm os pais, sem tempo de conhecer os filhos; correm estes desde manhã à noite sem tempo de amar os Pais; corre-se nos órgãos da Comunicação Social, mas não conhecem os leitores, ouvintes ou telespectadores; corre-se através dos telemóveis para se ganhar um emprego, um negócio e não há tempo para que se faça justiça social ou se seja competente nas acções do dia-a-dia.

É sempre a correr! Correm os governantes e cada vez mais se vêem acidentes na governação. A correria leva-os à incompetência, à ganância, ao desrespeito para com o povo e para quem os elegeu e leva-os à injustiça e ao indiferentismo. 

A correria daqueles que exercem lugares políticos, leva-os ao oportunismo, à insensibilidade e quase sempre à vida rapace, bem como ao desagrado e ao desinteresse dos eleitores na participação da vida em democracia.

Corre-se! Todo o mundo corre neste país, mas poucos sabem onde está a meta! 

Corre-se nos hospitais: entre corredores, atulhados de corredores que esperam por um médico que os atenda; correm os médicos e enfermeiros em azáfamas pouco claras, em balburdia profissionalizada e no profissionalismo do deixa correr, deixa que tombe e no “quem vier atrás que feche a porta”.

Corre-se nos estabelecimentos de ensino: entre os vários pelotões existentes, com vários interesses; com várias competências e incompetências, com gente dedicada e com madraços, com alunos verticais e com anarquistas e com professores de diversas ou nulas vontades de trabalhar, pela fome que o Ministério provoca a estes profissionais e pela reles condições de trabalho para um verdadeiro ensino.

Corre-se nos órgãos da comunicação social, onde se verifica que alguns destes profissionais não sabe o que é um tinteiro, uma caneta, um caderno de apontamentos e apenas conhecem o computador ou o telemóvel para enviarem mentiras, sensacionalismos, inverdades e hipóteses para denegrir seja quem for ou segundo as recomendações das pessoas a abater, bem como dos incompetentes a serem elevados.

Correm as ondas do mar: rebentam em qualquer espaço e correm os barcos e os navios estragados ou sem combustível, e correm atabalhoadamente os superiores hierárquicos da Marinha, ao esquecerem o perigo existente e denunciado, de como a frota portuguesa navega no alto mar.

Corre-se nas pescas, nos hipermercados: praticando preços exorbitantes, esmagando os consumidores, engordando com mais dinheiro os obesos do dinheiro e proporcionando desestabilidade familiar e social a quem necessita viver.

Sempre a correr! Correm os mentirosos, os vigaristas, os políticos invejosos, os sem educação dentro de casa e nas ruas, os inconscientes, os maldosos, etc. etc. etc.

Somente não corre a ciência, que não sabe buscar as causas dos que sempre muito correm; não correm os filósofos nem os pensadores, porque não estudam as correrias em que se vive; não correm os psicólogos, os psiquiatras e os sociólogos para apontarem tanta loucura e a medicação/caminhos para um Portugal sadio, com paz e com orgulho de se ser português.

Há mais de dois mil anos, a Marta dos evangelhos corria. Mas pediu ajuda para não ser louca da corrida. Hoje, o mundo, não pede ajudas para recuperar os valores perdidos, porque sempre a correr.

(O autor não segue o acordo ortográfico de 1990)

Artur Soares

Artur Soares

20 setembro 2025