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Porquê Nortadas

Após a longa maratona literária dos POSTAIS D'ARCADA (mil crónicas que levaram 24 anos a escrever – 1985/2009), iniciei a nove de setembro de 2009 as NORTADAS e muito longe estava de pensar que estas crónicas semanais teriam tamanha longevidade; porque, e já lá vão15 anos, não é fácil manter, com a desejada frescura e assiduidade, o interesse e motivação dos leitores, semana-a-semana, por estas Nortadas.

Ademais, num tempo dominado pela fatuidade, insatisfação e pouca adesão à leitura dos jovens e dos menos jovens, mormente face à sua dependência das redes sociais, não é fácil, acreditem, conquistar leitores; e, obviamente, quando muito forte e dominante é a liberdade de opinião e de opção vigentes – prerrogativa que, em regimes democráticos como o nosso, consentida é ao comum dos cidadãos.

Pois bem, no ato de apresentação das NORTADAS ao público leitor, justifiquei a escolha desse nome assim: nortada, vento áspero, forte e frio que sopra de norte a noroeste em Portugal; e isto significava que as ditas Nortadas não seriam em forma de elemento natural e meteorológico, mas de crónicas da vida real em forma de reflexões e chamadas de atenção e, porque não, de crítica por vezes mordaz à natureza das coisas e das ações das pessoas, fossem de que proveniência e condição profissionais e pessoais.

Ora, isto nos adverte para a nossa situação de transitoriedade e fragilidade de simples átomos, embora pensantes e atuantes, que somos na imensidão e intemporalidade do cosmos que habitamos; e, ademais, nos questiona sobre a forma como nos posicionamos no mundo: seus plenos donos, utilizadores ou usurpadores ou meros viandantes com direito, apenas, ao seu usufruto racional, inteligente e humanista, isto é, num universo sentido e vivido à imagem e semelhança do seu Criador.

E, assim, estas NORTADAS se vão fazendo de forma questionadora, desassossegada, denunciadora, frontal, livre, incómoda, independente e, sobretudo, de gritos de alma contra as injustiças, as grandes desigualdades, as exclusões, as humilhações, os ódios e as ofensas em que tão fértil é o nosso viver quotidiano, levados a cabo por homens nossos irmãos e companheiros de jornada, quantas vezes governantes, dirigentes políticos, superiores hierárquicos e, até, vizinhos de porta.

Pois bem, sempre me preocupo em escolher para tema das minhas crónicas semanais assuntos breves, intensos e concisos, dado que o tempo de que a maioria das pessoas dispõe para ler, seja um simples jornal ou um longo romance; é que, concretamente, o espaço dos jornais cada vez mais necessário é para tratar e atender os inúmeros problemas do dia-a-dia, quer das pessoas, quer das instituições, e, igualmente, entendo que esta forma direta de ir ao encontro das pessoas é a que melhor preenche a sua curiosidade e predisposição ao relaxamento pessoal, ao equilíbrio social e à sanidade mental.

Agora, também as NORTADAS servem muito agradavelmente de pausa, mesmo que fugaz, urgente e necessária para pensar e agir com ponderação, com moderação e com prudência, obstando, deste modo, ao surgimento e à imposição de momentos de radicalização e extremismos; e isto, num tempo todo ele virtual e descartável em que a pressa de viver de chegar primeiro, de ficar à frente e por cima, de não dar tempo ao tempo se transformou, declaradamente, na forma mais comum e normal de ser e estar na vida pessoal, social e institucional.

E deste modo fazer as pessoas parar, por cinco ou dez minutos que seja, para refletirem e dizerem não à fúria moderna – vazia, louca e inflexível – de viver consigo próprias e com as outras; e, até, para que não tenhamos de andar sempre a rezingar connosco e com os outros:

– Eh pá, vai cá uma nortada!

Então, até de hoje a oito.

Dinis Salgado

Dinis Salgado

26 novembro 2025