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“Desenhar novos mapas de esperança”

 


 

Com o intuito de assinalar o 60.º aniversário da Gravissimum Educationis1, o Papa Leão XIV publicou, no passado dia 28 de outubro, a Carta Apostólica Disegnare Nuove Mappe di Speranza, um texto profundo e inspirador sobre o valor da educação como expressão de fé, de serviço e de esperança para o mundo contemporâneo.

O documento situa a pessoa humana no centro de todo o processo educativo e reforça a ideia de que não pode ser reduzida ao utilitarismo ou à eficiência técnica. Cabe à educação ajudar a “florescer o humano” em todas as suas dimensões. E acrescenta que educar é evangelizar. Por isso, a educação não é uma tarefa secundária, mas a forma concreta de o Evangelho se tornar vida, relação e cultura. Num tempo de mudanças e incertezas, as comunidades que se norteiam pela palavra de Jesus Cristo não erguem muros, mas constroem pontes, potenciando o diálogo e a criatividade.

Logo de seguida, sublinha que a tradição educativa da Igreja nasce do evangelho e do exemplo dos santos educadores: dos Padres do deserto a Santo Agostinho, dos monges copistas às universidades medievais, até aos grandes mestres como S. José de Calasanz, São João Bosco e Maria Montessori, entre outros e outras. Lembra o Papa que educar nunca foi uma mera teoria, mas uma práxis inspirada pelo Espírito Santo e carregada de paixão e história.

Dado que ninguém educa sozinho, a educação cristã é uma obra coral a requerer uma comunidade educativa formada por família, professores, alunos, comunidades e pastores, um verdadeiro “nós” educativo. A escola católica só pode ser o lugar da fé viva, da cultura humanista e do diálogo aberto, onde o coração fala ao coração e o desejo de verdade se alimenta da razão e da fé.

O documento reafirma o direito universal à educação e lembra que a pessoa humana não é um “‘perfil de competências’, não se reduz a um algoritmo previsível, mas é um rosto, uma história, uma vocação”. A verdadeira educação forma a pessoa no seu todo – corpo, mente e espírito – e mede-se não apenas pela eficiência, mas sobretudo pela dignidade, justiça e serviço ao bem comum.

Educar é ensinar a ver como Abraão, com um olhar de fé e de esperança. A escola católica é um ambiente de vida e não apenas um lugar de instrução. Por isso, a missão dos educadores é da ordem do testemunho, sendo este tão importante quanto a sua competência profissional.

A Igreja propõe uma educação que respeite a diversidade dos contextos e aplique o princípio da subsidiariedade, colaborando com o Estado e as comunidades locais. A propósito, refere o Papa que a fé não é uma matéria extra, mas antes o sopro que dá vida a todas as matérias, o coração de um humanismo integral que reconcilia fé, razão e serviço. 

Educar é também contemplar a criação e reconhecer nela o reflexo de Deus. Deve, por isso, a educação católica unir justiça social e justiça ambiental, formando consciências responsáveis e pacíficas. Cada gesto de cuidado é uma lição de ecologia integral e de fé.

O mundo educativo católico é apresentado nesta Carta Apostólica como uma constelação viva, em que as escolas, as universidades, os centros e movimentos espalhados pelo mundo são diferentes, mas estão unidos pela mesma luz do Evangelho. É por esse motivo que o Papa os convida à colaboração global, no intercâmbio de saberes e na abertura a todos, mesmo a quem não partilha a fé, mas procura uma educação verdadeiramente humana.

No que concerne à tecnologia, acrescenta que ela não substitui a pessoa, mas deve servi-la. A inteligência artificial e os ambientes digitais exigem discernimento ético e espiritual, pois nada poderá substituir o toque humano da educação: a poesia, o amor, a arte, a alegria da descoberta e a coragem de aprender com os erros.

Com base no Pacto Educativo Global do Papa Francisco, Leão XIV não apenas recorda os seus sete eixos (pessoa, juventude, mulher, família, inclusão, economia e ecologia), como também acrescenta três prioridades: a vida interior, com espaços de silêncio e discernimento; o digital humano, com o uso ético das tecnologias; e a paz desarmada, com a educação para a reconciliação e a fraternidade. Com verdadeira ousadia profética, o Papa afirma que a rede educativa católica, presente em todos os continentes, é chamada a garantir qualidade e acesso aos mais pobres, porque “perder os pobres é perder a escola”.

O documento termina com uma constatação: “Desenhar novos mapas de esperança” é a missão da Igreja educadora. Num mundo marcado pela solidão, pelo conflito e pela desigualdade, a educação cristã é chamada a ser farol e laboratório de esperança: menos palavras agressivas, mais escuta; menos murros, mais pontes; menos rótulos, mais histórias.

A fechar, e confiando este caminho a Maria, Sede da Sabedoria, e a todos os santos educadores, o Papa pede que a Igreja continue a ser coreógrafa da esperança, buscadora incansável da sabedoria e artífice da beleza que nasce da fé.


 


 


 


 

1 Declaração do Concílio Vaticano II sobre a educação cristã, publicada a 28 de outubro de 1965. Diz o Papa que este texto, no atual ambiente educacional complexo, fragmentado e digitalizado não só “não perdeu a sua força”, como até mostra uma “resiliência surpreendente”.

Pe. João Alberto Sousa Correia

Pe. João Alberto Sousa Correia

3 novembro 2025