Desde 1976 , que a Constituição da República Portuguesa estabelece que a câmara, órgão executivo do município, é responsável perante a assembleia municipal, órgão deliberativo do município.
Essa responsabilidade implica, em bom rigor, que a aprovação de uma moção de censura pela assembleia municipal determina a queda do órgão executivo. E isso já era defendido firmemente pelo Professor Diogo Freitas do Amaral, embora não seguido pela maioria da doutrina pelo facto de essa queda não estar devidamente regulada pela lei.
E assim se compreende que na revisão constitucional de 1997 se estabelecesse no seu artigo 239.º, n.º 3 que uma lei, que deveria ser aprovada por maioria de 2/3 dos deputados, regulasse não só o sistema eleitoral, mas também os requisitos da constituição e destituição da câmara e o seu funcionamento.
Ora, passados mais de 25 anos, essa lei da Assembleia da República está por publicar, revelando por parte dos deputados claro e continuado desrespeito pela Constituição. Trata-se de uma evidente inconstitucionalidade por omissão.
E revela também, por parte das assembleias municipais, a sua fraqueza, pois doutro modo teriam agido colectivamente, reivindicando fortemente perante a Assembleia da República e demais órgãos de soberania um direito constitucional que lhes cabe. A regulação desse direito modificaria profundamente a posição das assembleias municipais no governo do município.
A câmara municipal saberia que dependeria da vontade da assembleia municipal e actuaria, tendo sempre esse facto em conta. É certo que já hoje depende nas deliberações fundamentais do município, desde a aprovação do orçamento aos contratos públicos, aos empréstimos e aos planos de urbanismo, por exemplo. Mas como a assembleia não pode derrubar a câmara acaba por articular-se, em regra, com ela para que o município não seja muito prejudicado.
Dir-se-á que essa moção de censura de pouco valeria, sempre que houvesse maioria absoluta de uma força política, mas não pode esquecer-se que mesmo em maioria absoluta há sempre a possibilidade de haver tensões política no grupo da maioria (por boas ou más razões) e uma aprovação de uma moção de censura não seria então de pôr de parte.
Ainda contra a moção de censura que destituiria a câmara municipal poderá dizer-se que perturbaria o governo municipal, que o município ficaria sem câmara e obrigaria a novas eleições.
Pode contrapor-se, no entanto, que num município que aprova uma moção de censura já o governo municipal não funciona certamente bem e se a queda da câmara provocasse como a nosso ver deveria a queda também da assembleia, as eleições seriam para os dois órgãos e seriam os eleitores a ter a última palavra na solução da crise política local. A assembleia teria o cuidado de não aprovar levianamente uma moção de censura porque saberia as consequências que essa aprovação teria.
Sem moções de censura, nos termos que a Constituição estabelece, as assembleias ocuparão sempre um lugar secundário no município.