Tem um sabor especial escrever sobre idosos avançados como um deles. Esta nota despretensiosa reflete algumas experiências quase banais. Começo por uma visita a um lar de idosos a um colega de 4.ª classe. Pude falar com ele e ainda nos entendemos, mas tive pena de não o ter visitado há mais tempo. Em contrapartida, visitei outro, também colega da 4.ª classe, que há dois anos encontrei a trabalhar na horta e agora a chegar a casa com a filha. Ainda continua a trabalhar na horta e só não come do que cultiva porque a filha passa mais tempo na França com os filhos, e as refeições vêm do lar. A última vez dizia-me, contente, que ele e eu éramos dos poucos idosos que ainda trabalham.
Tive outra surpresa no arraial ao comprar um livrinho intitulado “Aurora” escrito pela autora no lar. Ainda pensei que falava da aurora do nascer do sol, mas não. Era a autora a falar a escrever uma pequena autobiografia dela mesma para um projeto: “o idoso é uma biblioteca”. Descreve o nascimento, a janela da casa, as experiências de odores, de sementes, da escola, aos sete anos a cavar com os adultos, a recolher os cereais, o desejo de continuar a estudar aos 35 anos, como conseguiu e aprendeu a escrever o seu livrinho com ilustrações fabulosas. Era ela a Aurora do lar! Belo projeto.
Como idoso que ainda trabalho passei férias por países distantes onde há ameaças de drones e Migs e um tempo com os meus muitos sobrinhos e sobrinhas. Aqueles dias com os sobrinhos que cultivam as suas hortas foram para mim uma cura alimentar de refeições saudáveis de produtos frescos e bem digeríveis que me deram. Quem dera que todas as pessoas idosas tivessem esta cura. E a propósito de alimentos pouco recomendáveis para as idades avançadas. Há tempos, lembrei de perguntar num restaurante se tinha prato próprio para idosos. Que não. Mas encontrou um de peixe fresco, tenro e saboroso. Noutro restaurante: que não. Nem peixe, nem queijo fresco, nem vegetais bem cozidos, nem fruta madura e tenra. Por fim, remediou-se com uma sopa de puré de legumes. Aconselharia aos idosos com problemas de estômago e de dentadura a perguntar: tem pratos próprios para idosos? Talvez este seja um bom presente para a maior parte de nós.
Não é só o modo de escolher e cozinhar os alimentos que favorece a saúde. O mexer-se, andar (e descansar, claro) uma hora, meia hora de manhã e outra à tarde, é importante como me recomenda o meu médico. E outro, disse: ande a pé, mesmo que lhe doa, mas descanse. O ginásio não substitui o andar. Mexer-se é respirar melhor, melhorar os pulmões, o coração, os músculos, as articulações os nervos e o equilíbrio, como os médicos me vão repetindo. Sem boa respiração a qualidade da vida desce, e a qualidade da dimensão espiritual (espírito-sopro- vida que Deus dá e que naquele que respira bem e enche os pulmões, em silêncio pode fazer disso ser oração). E desejava lembrar que falar bem, falar alto para outros, proclamar é respirar melhor e pode ser oração e vida de melhor qualidade. Experimentem meus caros coetâneos como faz este vosso amigo. Falar é muito mais agradável se houver alguém a escutar com atenção. Os centros de Pessoas idosas teriam muito a ganhar em saúde e bem-estar se tiverem alguém que caminhe com eles e que quando descansam têm alguém que os escuta e falam eles com clareza e mais alto que o habitual. Não esquecer que “o idoso é uma biblioteca”.
E até podem surgir conversas muito mais espirituais que o habitual. Como por exemplo: e a seguir a esta vida que nos acontece? Ou ainda porque é que não nos tratam pelo nome e só dizem idosos? Idosos?
E agora para finalizar: na Parábola de Cristo o doente idoso e com fome tinha nome, Lázaro; o rico não tinha. Agora é o contrário. Os muito ricos são sempre tratados nas tv, nas rádio, nos jornais pelo nome e muitas vezes e com muitos louvores. As pessoas idosas e os pobres quase nunca são tratadas pelo nome. E até se estão a fazer leis para que não se fale dos seus nomes. Porque será? Envergonham? Penso que não será por já estarem como mortos antes de morrer? E termino com silêncio para respirar fundo, descansar e rezar.