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O que os portugueses deixaram em Angola – O Caminho de Ferro de Benguela

Sendo África um continente rico em produtos mineiros, e uma vez que o cabo da Boa Esperança não podia fornecer uma passagem económica para o mar vindo do interior, foi necessário lançar o Caminho de Ferro de Benguela (C.F.B.), um marco histórico que os portugueses deixaram em África, independentemente da continuidade da execução do caminho de Ferro do Cabo para o Cairo, em direção ao interior norte. 

À medida que este se desenvolvia em execução, a distância entre o seu terminus e o mar aumentava, dificultando a saída de minérios e outros produtos do interior do continente africano, assim como a chegada de combustível e outras matérias necessárias às colónias e regiões do interior de África.

O lançamento e desenvolvimento deste caminho de ferro foi fundamental para dar grande incremento às vias de comércio existentes em África, fazendo uma abertura à costa ocidental deste continente, através de um porto na costa, a Baía do Lobito, deixando Angola e outros países do interior mais perto dos portos europeus, vindo a ser o fulcro de um maior de um maior desenvolvimento mineiro, e não só, mas também ser um polo de exigências de facilidades de transportes de diversas mercadorias.

Assim nasceu o Caminho de Ferro de Benguela, que impulsionou o desenvolvimento da Baía do Lobito, cujo porto viria a tornar-se um dos mais importantes da África Ocidental. A sua conceção deveu-se ao escocês Sir Robert Williams, tendo o contrato de concessão, que incluía a construção sucessiva de ramais, sido aprovado por Decreto de 28 de novembro de 1902, data em que foi constituída a Companhia do C.F.B., com capital inicial de 3.000.000 de libras, 90% foi subscrito pela Tanganyika Concessions Ltd. e os restantes 10% atribuídos gratuitamente pelo Estado Português.

A construção deste caminho de ferro integrou-se num Plano de Cooperação com a Bélgica, promovido pelo Rei Leopoldo, que visava estabelecer a ligação do Congo aos caminhos de ferro do Katanga e da Rodésia. Esta ligação revelou-se essencial para a comercialização dos minérios de cobre de Katanga (Congo Belga, atualmente Zaire) e permitiu garantir um acesso ao mar mais curto e direto do que o proporcionado pela linha principal do Cabo ao Cairo ou pelo ramal que a Beira (Moçambique) poderia oferecer.

Sir Robert Williams compreendeu a imperiosa necessidade para o desenvolvimento da exploração dos minerais de Katanga e abastecimento de mercadorias para o interior, assegurando uma comunicação com o mar mais curta e direta e apostar na Baía do Lobito, magnífico porto natural, uma vez que a enseada de Benguela não reunia as condições para o movimento portuário e dar seguimento a milhares de toneladas de produtos vindos dos países limítrofes de Angola e apoio à Companhia de Diamantes de Angola, a partir da estação do Muxico (Luso).

As obras de construção começaram em março de 1903, com uma extensão de 1347 km, e a sua construção apresentou imensas dificuldades de engenharia devido à topografia das regiões atravessadas, subindo através de montanhas e gargantas apertadas, chegando a atingir altitudes de 1935 metros nos primeiros troços, até atingir o grande planalto de Angola, depois de passar o trajeto para Oriente através da divisória dos Rios Congo e Zambeze, até atingir a fronteira do Congo Belga.

Em 1908 foi aberto ao trânsito o primeiro troço até Cubal, o segundo troço em setembro de 1902 até ao Huambo (Nova Lisboa), o terceiro em outubro de 1913 até ao Chinguar, cuja construção ficou suspensa durante vários anos, tendo recomeçado em 1920 e chegado a Silva Porto (Bié) em janeiro de 1924 e atingiu o rio Cuanza em setembro de 1925, mas devido a dificuldades de financiamento e considerando a produção de cobre das minas de Katanga, a empresa Tanganyika Concessions Ltd., assumiu o financiamento para terminar a construção da linha férrea.

Depois de atravessar o rio Cuanza por uma ponte de ferro de 160 metros de comprimento, atingiu a divisória do Alto Zambeze, tendo chegado à fronteira do Congo Belga. Entrou em exploração em março de 1928, tendo recuado a fronteira angolense 100 km para leste, dando origem à alteração da fronteira mediante contrato feito em Luanda em agosto de 1927, em que o Governo Belga cedeu a Portugal 3000 km² do seu território no Congo.

A construção da ponte internacional sobre o Rio Luau permitiu à Compagnie du Chemin de Fer du Bas-Congo, fazer a ligação do Caminho de Ferro de Benguela à linha principal do Cabo ao Cairo, em Tshilongo, nos termos do acordo de Cooperação aprovado pelo Rei Leopoldo da Bélgica.

Após a conclusão desta obra incontornável que atravessou Angola, do Lobito à fronteira Leste, o interior de Angola sofreu um grande impulso no desenvolvimento económico, abrangendo diversas áreas, tendo sido fundamental para o transporte de minério de cobre do Katanga.

A dimensão desta ferrovia deu um grande impacto ao desenvolvimento do interior de Angola, originando cidades de referência, implementado a agropecuária, assim como foi fundamental para as colónias ou países do Leste da fronteira de Angola e ao mesmo tempo veio dar grande valor ao porto de Lobito, no este do Oceano Atlântico, vindo este a ocupar um lugar proeminente entre os grandes portos do mundo.

É de salientar que a construção do CFB foi a cooperação comercial de três nações aliadas: Portugal, Grã-Bretanha e Bélgica. Representa, portanto, um ensinamento dos pioneiros da civilização em África, sendo de toda a justiça a visão que teve Portugal para este projeto. Ficam para a história os nomes do General Joaquim José Machado, Conselheiro Madeira Pinto, Alexandre Pinto Basto, Daniel Lane e Mariano Machado, indissoluvelmente ligados ao CFB como os mais dedicados e firmes colaboradores de Sir Robert Williams na realização da sua grande obra.

Nada temos de dar e muito deixamos a Angola, o que não aconteceu com outros países colonizadores.

Bernardo Reis

Bernardo Reis

24 setembro 2025