twitter

Há 36 anos que «morro» – todos os dias – com Ele

Há muita coisa de que me arrependo na vida. 

Mas sobre uma decisão que tomei o remorso nunca me visitou: ter dito «sim» ao Senhor quando me escolheu para ser padre.


 

Não fui eu que O escolhi; foi Ele – que na Sua infinita bondade e insondável compaixão – me escolheu (cf. Jo 15, 16). 

A mim que, sendo gago profundo, teria uma miríade de contra-indicações para não merecer tal chamamento.


 

Acontece que, hoje como ontem, Deus não escolhe os capazes; prefere capacitar os escolhidos. 

É a Sua força que supre a nossa fraqueza; é a Sua presença que preenche o nosso vazio.


 

É por isso que, sem Deus, não somos nada (cf. Jo 15, 5).

É por isso que, com Ele, conseguimos tudo (cf. Fil 4, 13).


 

Cedo percebi que ser padre é antes de mais estar com Jesus, entregar-se a Ele, deixando que seja Ele a fazer tudo em nós.

Um sacerdote que está perto de Jesus está perto das pessoas. Elas sabem – como anotou Robert Michel – que «um sacerdote que reza é um sacerdote que ama».


 

Rezar não é outra coisa senão fixar o nosso olhar em Jesus, enamorando-nos por Ele, sorvendo o Seu amor. 

E é esse amor que transportamos às pessoas; a todas, às que o merecem e às que, não o merecendo, mais precisam dele.


 

A um jovem padre, vacilante na vocação, o velho pároco foi cortante: «Tu não rezas o suficiente. Sofres mais do que rezas. E precisamos de rezar na proporção das nossas dores» (George Bernanos).

A ilação é óbvia: quanto mais sofremos, mais precisamos de rezar, de estar com Jesus.


 

Entre as tribulações do mundo e as consolações de Deus, é um privilégio inaudito – até porque totalmente imerecido – poder celebrar todos os dias a Eucaristia.

Nela, «todos os dias subo até ao Calvário com Cristo e todos os dias morro com Ele na Cruz» (Robert Michel).


 

Não há dia nenhum em que não me surpreenda: como é que o Senhor me escolheu para Seu sacerdote, a mim, filho de uma remota aldeia sem menção em qualquer roteiro?

Porque é que Ele pousou os olhos em mim, tão insignificante e indigno?


 

Em cada manhã e no declinar de cada dia, fico simplesmente maravilhado e sumamente reconhecido.

Deixei de contar comigo por saber que Ele está sempre em mim. As minhas fragilidades não contam. Só Ele conta, só Ele basta. Há 36 anos. E até quando Ele quiser!

João António Pinheiro Teixeira

João António Pinheiro Teixeira

12 agosto 2025