Confesso a minha ignorância: não sabia que se não podia criticar os árbitros em Portugal. Este mesmo país que restaurou liberdades e vive há mais de 50 anos uma liberdade plena, como consente uma coisa destas?! Então podemos não concordar com o presidente da república, cabe-nos o direito de discordar do primeiro-ministro, vamos para as ruas manifestar os nossos direitos ou esbulhos, temos o direito de discordar de uma sentença, sabemos que há liberdade de opinião desde que não seja opinião gratuita ou ofensiva, e então não se pode discordar desta ou daquela apitadela dos árbitros do futebol?! Mas então somos livres para tudo ou há grupos de pessoas organizadas em classes privilegiadas que não se podem contestar, muito menos beliscar? Mas que Portugal de Abril é este? Há quantos pesos e quantas medidas para a liberdade de opinião? Teremos de concluir que a liberdade de opinião não é para todos porque há grupos e grupinhos que não se podem “ofender” com a divergência de pareceres ou apreciações diferentes dos “juízes” de campo? Estou estupefacto e não percebo como os políticos portugueses, tão aguerridos em procurar com minudência a verdade dos atos, não se impõem e lhes dizem: alto lá, toda a gente tem o direito de criticar até um julgamento judicial, e então por que razão não podeis discordar de umas apitadelas? Não sei compreender esta exceção. São mais isentos de julgamento só porque se está em âmbito do chuto? Os erros que os árbitros cometem não podem ser criticados? Escondem-se e escudam-se em que leis constitucionais para fazer estas exceções? Na verdade, fica-nos na alma um grito de revolta e espanto. De revolta porque a liberdade de expressão de pensamento ganhou em nós o ninho da essência democrática, e de espanto por saber que há outros ninhos esconsos onde agasalham privilégios de classe. Não pode ser. O que pode ser é toda a gente ser livre de expressar por escrito ou de viva voz o seu parecer sobre o acontecido, assim como deve estar sujeito a qualquer crítica. Isto, a ser verdade de que os árbitros não podem ser censurados pelos analistas e ou treinadores de futebol, leva-me ao passado das classes dominantes e reporta-me a uma autocracia que de todo repudio. Em rodapé: eu defendo princípios e não pessoas.