Há quase oito séculos, São Francisco de Assis ergueu a sua voz para entoar um dos textos mais belos da espiritualidade cristã: o “Cântico das Criaturas”, uma poesia que não é apenas oração, mas também uma celebração da vida e da criação em todas as suas formas. Francisco olhou para o mundo com olhos de irmão: chamou irmão ao sol, irmã à lua, irmão ao vento e até irmã à morte. Tudo estava ligado, tudo era dom, tudo era sinal de Deus. Hoje, ao contemplarmos o Minho, sentimos que também aqui se pode cantar esse hino de fraternidade cósmica. Porque o Minho é uma terra que respira espiritualidade através da sua natureza, da sua cultura e da sua gente.
Quando o rio Lima se espraia sereno, ou quando o Gerês se cobre de verde e de neblina, há uma prece silenciosa que sobe ao céu. O agricultor que cuida das vinhas, a mulher que colhe as uvas, o pescador que lança as redes no Cávado – todos, consciente ou não, participam no cântico franciscano. A terra minhota é fértil, mas também exigente; pede mãos generosas e corações resilientes. E na relação íntima com a terra, reencontramos a lição de São Francisco: a criação não é um recurso, é um dom.
Como nos dizia um agricultor dos arredores de Braga: “A terra fala connosco. Se a tratarmos com respeito, ela devolve-nos em dobro. É como se fosse também nossa irmã.”. O Minho tem um modo muito próprio de ser franciscano. Na hospitalidade simples das aldeias, nas romarias que unem fé e festa, no convívio das mesas fartas onde o pão é sempre partilhado, respira-se a espiritualidade de Assis. Francisco teria gostado do Minho: a alegria popular, o gosto pela música e pela dança, a capacidade de celebrar a vida com intensidade e gratidão. Aqui, as gentes sabem que viver é mais do que possuir: é acolher, partilhar e celebrar. Uma jovem de Braga comentava: “Nas nossas romarias, sinto que não é só tradição: é uma maneira de nos unirmos, de cuidarmos uns dos outros. É isso que dá sentido.” Mas cantar o cântico das criaturas no coração do Minho também é assumir responsabilidades. O ambiente natural da região – rios, montes, campos – pede cuidado. A pressa, o consumo excessivo, a indiferença podem transformar este paraíso em ferida.
O nosso saudoso Papa Francisco, na encíclica Laudato Si’, recorda-nos que “tudo está interligado, e isto convida-nos a amadurecer uma espiritualidade da solidariedade global que brota do mistério da Trindade” (LS 240). Esta visão ressoa profundamente com a espiritualidade franciscana: o cuidado pela Casa Comum é inseparável do cuidado pelos irmãos, sobretudo os mais frágeis.
“O Cântico das Criaturas no Coração do Minho” não é apenas uma metáfora poética. É uma realidade que se renova cada manhã quando o sol desponta sobre as margens do Minho, quando o sino da igreja chama a comunidade, quando um jovem se oferece ao serviço dos pobres, quando um idoso ensina um provérbio antigo à nova geração. É a vida, tal como é, transformada em louvor. É o Minho, com a sua alma tão própria, a juntar-se à voz de São Francisco para proclamar: Louvado sejas, meu Senhor, pela beleza da tua criação e pela fraternidade que nela nos une.