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Voz aos militares

 

 



 

Se há lugar onde deveria ser observado o conselho de Pitágoras (filósofo grego, (520 a.C.), que dizia: “messa os seus desejos, pese as suas opiniões e conte as suas palavras”, é nalguns canais da TV portuguesa: RTP3, SIC Notícias, CNN, CM e NOW, em cuja maior parte do tempo de antena é usado por comentadores disto e daquilo a debitarem o que lhes vem à cabeça, ou não fosse Portugal um país livre onde tudo opina.

Contudo, foi a partir da invasão da Rússia à Ucrânia que se juntaram à plêiade de palradores civis os coronéis, brigadeiros e generais aptos a relatarem as agruras e consequências da guerra. Ou não fossem eles os principais especialistas no ramo. O que não é de todo despiciendo, dada a bagagem não só teórica – adquirida nos estudos militares –, como prática obtida, julgo eu, durante a instrução ministrada quer nos centros de instrução nacionais, ou nas missões internacionais. 

Ora, se tais oficiais superiores são, às vezes, alvo de críticas por procurarem ganhar mais alguns trocos para complemento da sua aposentadoria, o certo é que têm trazido ao conhecimento da maioria dos portugueses, mais distraídos, muito do que até aqui era apenas do foro dos quartéis. Falo dos nomes do armamento, cada vez mais sofisticado e letal, em uso na guerra que avassala a mártir pátria ucraniana.

A propósito, lembro-me de que, ainda aqui há uns anos, os drones exerciam uma função quase lúdica, vistos como brinquedo da moda. Hoje, são uma arma perigosa a despejar explosivos onde os beligerantes pretendem. Algo que é altamente destruidor e que, juntamente com os mísseis, rasgam as nuvens no céu com a intenção não só de vigiar as posições inimigas, como matar soldados e destruir equipamentos. 

Para além desses, outros nomes de material bélico vêm sendo referidos por esses oficiais, na reserva, tais como os dos artefactos usados em terra, no ar e no mar, cada vez mais velozes e tecnicamente avançados. Dando notas explicativas sobre a sua origem, caraterísticas, alcance e amplitude destrutiva, ou não fossem eles mestres das nossas Forças Armadas, aptos a comandar a frente de combate numa hipotética situação de beligerância que afete o território português. Assim como no caso de serem destacados para missões na NATO da qual fazemos parte.

Uma outra vantagem da prestação televisiva dos senhores militares graduados prende-se com o facto de revelarem aos espectadores a nomenclatura de pessoas, regiões, cidades e localidades antes desconhecidos entre nós. Mais da Ucrânia do que da Rússia, uma vez que se trata da agredida e da agressora. Daí, a identificação nos respetivos mapas dos alvos das investidas da Federação russa, dos avanços e recuos de ambos os lados no terreno. Algo que vem trazendo alguma discordância na discussão entre tropas e civis nos comentários, motivada por divergências do ponto de vista interpretativo de cada um.

Ademais, tais discrepâncias têm dado azo a algumas inusitadas querelas entre os elementos convidados, sempre que há debates sobre o assunto. Ao ponto de já ter assistido a ameaça de abandono do painel por parte de um dos discordantes. Dessa vez, bastaram as palavras de um major-general, pró-Moscovo, entrar em desacordo com uma especialista civil do tema, defensora de Kiev, para saltar a tampa aos dois. Mas não foi o único caso, outros há manifestamente inclinados para a derrota dos ucranianos, aliás, desde o início da invasão russa, em 24 de fevereiro de 2022.

Não obstante as quezílias entre comentadores, elas vão dando não só alguma vivacidade aos programas, como espevitam os espectadores. Mesmo assim, já que nenhum é o dono da verdade, eu cá preferia o apaziguamento entre eles, numa espécie de apelo à paz. Agora, se me perguntarem se preferia não ter de assistir à TV a dar voz aos militares – para falarem acerca do conflito e dos resultados obtidos por ambas as partes –, lá isso preferia. Era sinal de que terminara a mortandade a que assistimos recostados conforto do sofá lá de casa.



 

 

 

Narciso Mendes

Narciso Mendes

4 outubro 2025