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Consumidos pela habitação

A habitação, ou a falta dela, tornou-se um dos temas mais discutidos no nosso país, sobretudo devido à escassez da mesma para quem pretende comprar ou arrendar. As principais causas para esta escassez da oferta de habitação no mercado não são particularmente difíceis de encontrar.

Podemos começar por referir a crise económica que afetou Portugal (assim como a Grécia, Espanha e outros países) na sequência da crise financeira global de 2007/2008 e que se prolongou até 2015. De facto, na passagem para este século, construíam-se mais de 60.000 edifícios/ano em Portugal, valor que em 2008 já se tinha reduzido para 40.000 e que atingiu o valor mais baixo em 2016 com 11.059. Em 2023 este indicador registava uma recuperação (17.266), ainda assim muito longe dos valores do início deste século. O forte decréscimo na atividade de construção civil levou ao encerramento de inúmeras empresas, com os respetivos trabalhadores a emigrar ou a mudar de atividade profissional.

Simultaneamente, nos últimos anos a imigração tem crescido de forma significativa no nosso país, com a população estrangeira a quadruplicar em 9 anos. Em 2023 o número de estrangeiros a residir em Portugal atingiu os 1,6 milhões, cerca de 15% da população total. Este súbito aumento da população residente colocou uma enorme pressão no mercado da habitação, seja na compra de casas novas ou usadas, seja no arrendamento. E em todas as tipologias, das mais económicas ao segmento premium. Uns vêm dos EUA e do norte da Europa para gozar as suas reformas em Portugal e procuram casas mais luxuosas, sem se preocuparem muito com o preço, o que o fez aumentar significativamente. Mas também temos as famílias nacionais e os imigrantes que buscam casas mais baratas, normalmente situadas nas periferias dos grandes centros urbanos, mas que, devido à forte procura, também fez disparar o seu preço para valores inimagináveis há 10 anos atrás. Todos sabemos que em Braga, recuando cerca de10 anos, era possível encontrar um apartamento com uma tipologia T3 à venda por valores a rondar os 100.000€ e que hoje não se consegue encontrar por menos do triplo daquele valor.

Não podemos deixar de referir ainda o forte aumento do turismo no nosso país e do contributo que a procura de alojamento turístico teve no mercado da habitação. De facto, muitos proprietários desviaram os seus imóveis do mercado do arrendamento de longa duração (e da venda) e converteram-nos em alojamentos locais para turismo. O número de propriedades registadas em grandes plataformas digitais aumentou exponencialmente. Só a Airbnb possuía perto de 50.000 alojamentos registados em 2016.

Finalmente, as políticas públicas relativamente à legislação do arrendamento, assim como à sua tributação, podem ser indutoras de travões à vontade dos proprietários colocarem as respetivas propriedades no mercado de arrendamento. Se a lei procurar condicionar muito o valor das rendas e o regime dos contratos de arrendamento, em especial, a sua duração e cessação, e se a tributação sobre o seu rendimento (rendas) for considerada elevada, a disponibilidade dos proprietários e investidores para apostar no arrendamento diminui fortemente.

Por estas e outras razões os preços das habitações continuam a bater sucessivos recordes. Só no primeiro trimestre de 2025 o preço das casas disparou, aumentando 16,3% e, no mesmo período, o valor mediano das rendas por m2 dos contratos de arrendamento situou-se nos 8,22€.

São más notícias para quem precisa de comprar ou arrendar casa. Acresce que não é um problema que se possa resolver do dia para a noite. São necessários anos ou décadas de políticas consistentes que incentivem a construção de novos edifícios destinados a alojamento das famílias e que motivem os investidores públicos e privados a investir mais no setor.

Fernando Viana

Fernando Viana

26 julho 2025