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Não havia “Igreja ‘Católica’” no Segundo Século

Para se entender este mito que, na verdade, pode ter uns pós de verdade, é preciso compreender que ele se insere numa nuvem de outros mitos que visam mostrar que a Igreja Católica não é a Igreja fundada por Jesus ao longo de toda a Sua vida e do envio do Espírito Santo santificador recapitulador aquando do Pentecostes.

Todavia, é preciso ter em conta que uma coisa é não haver determinada realidade e outra é não a haver com determinado nome. Um mero exemplo: todos nós já tínhamos passado a existir aquando da nossa conceção e, não obstante, não tínhamos um nome.

Ou seja: mesmo que fosse o caso de no séc. II não se denominar de “Católica” a Igreja desejada e implementada por Jesus (e depois expandida na história pelos Apóstolos e seus sucessores), isso não significa que a mesma não existisse, nem que ela não existisse com os traços ou notas identificadoras da mesma quando passou a adquirir a sobredita designação.

Quando alguns católicos são confrontados com este mito, ocorre não saberem o que dizer, ou, se tiverem lido algo sobre o tema numa perspetiva facilitadora, tropeçando mesmo na tentação de dizer que, no segundo século, já havia quem chamasse à Grande Igreja (nome mais comum nessa época para se referir à Igreja de Jesus) de “Igreja Católica”. Ora, referi há pouco a palavra “tentação”, e disse-o porque, embora seja um facto de que já se falava em “Igreja Católica” no séc. II, esta denominação não era usada para significar o que o binómio “Igreja Católica” acabou por expressar até hoje, mormente através dos seus sobreditos traços característicos.

Se no Novo Testamento se designava à Igreja de Jesus pela simples palavra “Igreja”, passou-se não muitos decénios depois a anteceder essa palavra de uma outra: “Grande” (em oposição às igrejas sectárias que eram diminutas em termos de fiéis). Só em inícios do séc. II é que (o já nosso conhecido) São Inácio de Antioquia fala em “Igreja Católica” pela primeira vez na história e muito antes de “Católica” passar a formar, com “Igreja”, um nome composto.

Mas porque o fez? Segundo parece ser o consenso atual, ele fê-lo para se referir àquela Igreja formada pelas diferentes comunidades que, face ao gnosticismo, se conservaram unidas e firmes quanto à doutrina (não falo de “O Martírio de Policarpo”, pois aí temos um acrescento).

Neste sentido, e como também ocorre no “Fragmento de Muratori”, o adjetivo “Católica” em “Igreja Católica” tende a dar azo a que possa significar “não-cismática” (ou “não-separada”) e, conjuntamente, “ortodoxa”. Quer dizer: que manteve a união e a pureza no pensamento e na expressão correta a respeito de Jesus, da Sua mensagem e da identidade da Igreja por Ele estabelecida para prolongar na história a possibilidade de se reconhecer a Sua missão salvífica.

Nos finais do séc. II, começa-se a usar “Católica” como um apelativo; isto é, e como já referi, como uma parte de um nome indivisível: “Igreja(-)Católica”. Mais: principia-se a entender “Católica” como significando algo como “uma e única” e (ou) ter a plenitude dos meios da salvação e talvez (embora sendo pouco provável) até “universal”. Isto é, conotando o ter como perfil e missão (e fruto da tensão expansiva do amor) o ser uma presença global.

Alexandre Freire Duarte

Alexandre Freire Duarte

21 maio 2025