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À espera do Conclave (2)


 

Enquanto decorrem os nove dias de oração e luto pelo Papa Francisco, bem como as Congregações Gerais1, estamos à espera do Conclave, com início marcado para a próxima quarta-feira, dia 7 de maio. Por outras palavras, os cardeais preparam-se para a eleição do sucessor de Pedro e nós estamos na expetativa do que vai acontecer. 

Em tempos remotos, o bispo de Roma era escolhido mediante o consenso do clero e dos leigos da diocese. Porque foram acontecendo muitas interferências seculares nessas eleições, o Papa Nicolau II, em 1509 e mediante o decreto In Nomine Domini, reservou esse direito ao Colégio dos Cardeais.

Reza a história que, após o falecimento do Papa Clemente IV, no dia 29 de novembro de 1268, os dezanove cardeais eleitores, reunidos em Viterbo, demoravam-se na eleição de um novo Papa e, por isso, Alberto di Montebono, magistrado da cidade e comandante da milícia, “arrancou o telhado do palácio papal, expondo os eleitores às intempéries e impedindo que lhes levassem comida, para os obrigar a tomar uma decisão”2. Foi a mais longa eleição papal da História da Igreja (1006 dias), que só terminou no dia 1 de setembro de 1271, quando foi eleito Teobaldo Visconti3. Não era cardeal nem membro da Cúria Romana, mas arcediago da diocese de Liège (região da Valónia, Bélgica). Na altura, encontrava-se na Terra Santa, com o futuro rei de Inglaterra, Eduardo I, participando na Cruzada a São João de Acre. A nomeação apanhou-o de surpresa e só chegou a Viterbo e depois a Roma quatro meses mais tarde. Em 27 de março de 1272, depois de ter sido ordenado sacerdote e consagrado Bispo, foi entronizado com o nome de Gregório X.

Uma das suas grandes decisões como Papa foi convocar um concílio4, que teve lugar em Lyon, no ano de 1274. Entre muitas outras coisas, debateu-se o processo da eleição pontifícia e definiu-se normas para tal, depois exaradas na Constituição Apostólica Ubi periculum. Foi neste documento que, pela primeira vez, se usou a expressão latina cum clave (“com chave”), de onde provém o termo “Conclave”, com que se designa a assembleia constituída para a eleição do Papa.

Desde 1878, o Conclave acontece na Capela Sistina e nele participam os cardeais com menos de 80 anos5, que juram manter absoluto segredo sobre quanto lá ocorre6. As votações (“escrutínios”) são secretas, acontecem duas de manhã e duas à tarde, e só terminam quando dois terços dos votos incidem sobre o mesmo cardeal7

Eleito um novo Papa, é-lhe perguntado: “Aceitas a tua eleição como Sumo Pontífice?”8 Se sim, deve o eleito escolher um nome papal. Os boletins de voto e as anotações pessoais são queimados e é avistado na Praça de S. Pedro fumo branco9. Por esse sinal, se comunica a quem lá está aquilo que, pouco depois, o Cardeal Proto-diácono10 anunciará na varanda da Catedral: Annuntio vobis gaudium magnum: Habemus Papam! Eminentissimum ac reverendissimum Dominum, Dominum (nome do Cardeal eleito), Sanctae Romanae Ecclesiae Cardinalem (sobrenome), qui sibi nomen imposuit (nome papal)11

Independentemente do nome que se queira ou se sonhe ouvir, o mais importante é que a nossa espera pelo Conclave e pelos seus resultados seja acompanhada pela oração e pela aceitação do que dele surgir. Acreditamos que a escolha é sempre assertiva, como, aliás, a história recente o vem provando. 


 

1 Reuniões realizadas antes de um Conclave, com a participação de todos os cardeais presentes em Roma, mesmo os que não poderão votar. Nelas se discutem temas sobre o estado da Igreja e os desafios que ela enfrenta. Servem também para organizar os aspetos práticos do Conclave. 

2 John-Peter Pham, Herdeiros do Pescador. Nos bastidores da morte e da sucessão papal (Mem Martins: Publicações Europa-América, 2005), p. 98.

3 Nasceu em Piacenza (região da Emilia Romagna), no ano 1210. Era estudioso e apóstolo zeloso, amigo de S. Tomás de Aquino e de S. Boaventura e tinha sido um dos organizadores do Primeiro Concílio de Lyon, que foi convocado pelo Papa Inocêncio IV e se realizou em 1245.

4 Foi no regresso de uma das sessões deste concílio que, em Arezzo (Toscana), no dia 10 de janeiro de 1276, Gregório X faleceu. 

5 Foi o Papa Paulo VI, com a bula Ingravescentem aetatem, que limitou a idade dos eleitores. Apesar de a Constituição Universi Dominici Gregis determinar que o número de cardeais eleitores não deve ultrapassar 120, há, neste momento, 133 (na verdade, são 135, mas dois não se deslocaram a Roma, por motivo de doença) e todos votarão.

6 A não observância deste sigilo acarreta excomunhão automática.

7 Se os eleitores forem 120, dois terços são 80. Como são 133, serão necessários, pelo menos, 84.

8 O Cardeal em causa pode recusar. Nesse caso, procede-se a novas votações.

9 O fumo branco resulta da combustão dos boletins de voto, a que se juntam alguns fumígenos: cloreto de potássio, lactose e colofónia, uma resina natural, de cor âmbar, extraída das coníferas.

10 O atual Cardeal Proto-diácono é, neste momento, Dominique François Joseph Mamberti, cardeal francês de origem marroquina.

11 A tradução soa assim: “Anuncio-vos uma grande alegria: Temos Papa! Eminentíssimo e Reverendíssimo Senhor, Senhor (primeiro nome), cardeal da Igreja Católica Romana (sobrenome), que escolheu para si o nome de (nome papal)”.


 

Pe. João Alberto Sousa Correia

Pe. João Alberto Sousa Correia

5 maio 2025