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À espera do Conclave (1)

 


 

Com o falecimento do Papa Francisco, na passada segunda-feira, dia 21 de abril, a Igreja entrou em Sede Vacante, expressão que designa o período de tempo que decorre entre a morte de um Papa e a eleição do seu sucessor. 

Num primeiro momento, assume especial relevo a figura do Cardeal Camerlengo1, a quem cabe confirmar a morte do Papa, de acordo com a Constituição Apostólica Universi Dominici Gregis (UDG), publicada pelo Papa João Paulo II, a 22 de fevereiro de 1996: “Logo que receber a notícia do falecimento do Sumo Pontífice, o Camerlengo deve constatar oficialmente a sua morte, na presença do Mestre das Celebrações Litúrgicas Pontifícias, dos Prelados Clérigos da Câmara Apostólica e do Secretário e Chanceler da mesma, o qual lavrará o documento ou ata autêntica de morte. O Cardeal Camerlengo deve, ainda, aplicar os sigilos no escritório e no quarto do Pontífice, estabelecendo que o pessoal habitualmente residente no apartamento privado possa permanecer nele até se realizar a sepultura do Papa, quando será sigilado todo o apartamento pontifício; participar o seu falecimento ao Cardeal Vigário para a diocese de Roma, o qual, por seu turno, dará a notícia do mesmo ao Povo Romano, com uma notificação especial; e igualmente ao Cardeal Arcipreste da Basílica do Vaticano; tomar posse do Palácio Apostólico do Vaticano e (...) dos Palácios de Latrão e de Castel Gandolfo, e exercer a custódia e o governo dos mesmos; estabelecer, depois de ouvidos os Cardeais primeiros das três ordens2, tudo aquilo que diz respeito à sepultura do Pontífice, a não ser que este, enquanto vivia, tenha já manifestado a sua vontade a tal propósito; cuidar, em nome e com o consenso do Colégio dos Cardeais, de tudo aquilo que as circunstâncias aconselharem para a defesa dos direitos da Sé Apostólica e para a sua reta administração. Com efeito, é atribuição do Camerlengo da Santa Igreja Romana, durante o período de Sé vacante, cuidar e administrar os bens e os direitos temporais da Santa Sé, com o auxílio dos três Cardeais Assistentes, precedido (...) do voto do Colégio dos Cardeais” (nº 17).

Durante a vacância da Sé Apostólica, cabe ao Colégio dos Cardeais orientar a Igreja, com algumas limitações, como é definido no início da já referida Constituição. Não tem jurisdição no que se refere às questões da competência do Sumo Pontífice (nº 1), “mas somente para o despacho dos assuntos ordinários ou inadiáveis (cf. no 6), e para a preparação daquilo que é necessário para a eleição do novo Pontífice. Este encargo deverá ser desempenhado nos termos e limites previstos por esta Constituição: deverão, por isso, ficar absolutamente excluídos os assuntos, que – quer por lei, quer por costume – ou são apenas do poder do próprio Romano Pontífice, ou dizem respeito às normas para a eleição do novo Pontífice, segundo as disposições da presente Constituição” (nº 2).

Os poderes do Colégio Cardinalício estão também cerceados no que respeita às leis emanadas pelos Sumo Pontífices: “não podem ser corrigidas ou modificadas, nem se lhes pode acrescentar ou subtrair qualquer coisa, nem dispensar, mesmo que seja só de uma parte delas, sobretudo no que diz respeito ao ordenamento da eleição do Sumo Pontífice” (nº 4).

Apesar de bastante explícita, a referida Constituição Apostólica ressalva que, no caso de dúvidas na sua interpretação ou no modo de as pôr em prática, pode o Colégio dos Cardeais emitir um juízo, dado que lhe é reconhecida a “faculdade de interpretar os seus pontos duvidosos ou controversos, estabelecendo que, quando for necessário deliberar sobre estas e outras questões semelhantes, exceto sobre o ato da eleição, é suficiente a maioria dos Cardeais congregados chegar a acordo sobre a mesma opinião” (nº 5). 

O Papa foi sepultado no passado Sábado, dia 26. Decorrem, entretanto, os Novemdiales, nove dias de oração e de luto, em que a Igreja já se encontra à espera do Conclave. Devendo realizar-se entre quinze a vinte dias após a morte do Papa (UDG, nº 37), o Conclave é precedido da Missa Pro Eligendo Romano Pontifice, celebrada pelos cardeais eleitores. É presidida pelo Cardeal Decano e assume-se como um momento solene de invocação do Espírito Santo3 para guiar a escolha do novo Sumo Pontífice (UDG, nºs 49-50).

Enquanto esperamos o Conclave, são muitas as opiniões, os palpites e as apostas sobre o sucessor do Papa Francisco. Penso, contudo, que o mais importante é que a Igreja se recolha em oração, numa espécie de Sábado Santo, em pleno Tempo Pascal, para que seja o Espírito a sugerir a melhor escolha em relação ao Sumo Pontífice e os melhores caminhos para a Igreja. 

 

1 ​Termo italiano que pode traduzir-se por “camareiro”. É sempre um cardeal, mas com frequência só se torna conhecido no momento da Sé Vacante. O cargo foi retratado no livro/filme Anjos e Demónios, de Dan Brown, o que despertou o interesse por essa figura e função. O atual camerlengo é o cardeal Kevin Joseph Farrel. Nascido em Dublin, é cidadão norte-americano e foi nomeado para tal pelo Papa Francisco, a 14 de fevereiro de 2019. 

2 As três ordens são os Cardeais-bispos (bispos que têm título de uma das dioceses suburbicárias de Roma ou que são designados diretamente como tal pelo Papa), os Cardeais-presbíteros (arcebispos de grandes dioceses que recebem o título de uma Igreja de Roma, simbolizando a sua colaboração com o Papa) e os Cardeais-diáconos (membros da Cúria Romana que, depois de dez anos, podem pedir para passar a ser cardeais-presbíteros).

3 Por esse motivo, costuma terminar com o Veni Creator Spiritus, cântico que acompanha a deslocação dos Cardeais para a Capela Sistina, ligar e sede da realização da eleição.

Pe. João Alberto Sousa Correia

Pe. João Alberto Sousa Correia

28 abril 2025