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Será assim que a televisão contribui para o nosso direito à informação?

Os últimos anos viram o aparecimento de uma nova era: a Era da Informação. A utilização generalizada da Internet permite a todos (talvez com a exceção da Coreia do Norte), em qualquer lugar e a qualquer hora, ter acesso ao que se está a passar neste momento no Bairro de Queens, em Nova Iorque, ou o saber o menu do dia de um conhecido restaurante de sushi de Tóquio. Por outro lado, as redes sociais (Facebook, Instagram, X, etc), amplificam, torcem, retorcem e distorcem os acontecimentos com relevância social, como sejam a vitória (ou derrota) do nosso clube de futebol; uma frase mais ao lado de uma qualquer personalidade (quem não se lembra da recente “Trump é um ativo soviético”); uma decisão do Governo que mexe com os interesses de um grupo ou corporação. Tudo, mas tudo é debatido nas redes sociais, escrutinado, deglutido, digerido e regurgitado em todos os seus possíveis e (in)imagináveis ângulos de análise. Ao ponto de criar nojo e enjoo profundo.

As televisões em particular atravessam uma crise de identidade e lutam por afirmar a sua relevância num mundo que cada vez coloca mais em causa os mass media clássicos (TV, rádios e jornais que se afirmaram sobretudo e ainda funcionam na lógica da segunda metade do século XX), que praticam um tipo de jornalismo o qual, do ponto de vista de uma análise meramente pessoal e, como tal, subjetiva e empírica, as faz aproximar cada vez mais do abismo da irrelevância e desinteresse social, refletidos na contínua quebra de audiência e de telespetadores. Isto afeta todos os canais televisivos, sejam eles generalistas ou especializados em informação.

Cada vez tenho menos vontade de ver televisão porque a programação é extraordinariamente desinteressante e redutora, quase um atentado à nossa sensibilidade e inteligência. Os canais informativos procuram sobretudo transmitir acontecimentos noticiosos que estão na berlinda, são momentaneamente hipervalorizados e debatidos até à exaustão, para logo de seguida desaparecerem na vacuidade e na espuma dos dias, sendo esmagados pelo rolo compressor do próximo evento. O denominador comum é fazer “render o peixe” o mais barato e o mais longamente que for possível.

Reparem, se não é verdade que nos últimos três meses, os canais e programas noticiosos percorreram todos, de braço dado o seguinte programa: o mês de julho foi dedicado sobretudo a falar dos problemas dos imigrantes alojados em construções precárias no Bairro do Talude, no Seixal, com jornalistas em direto, semanas a fio a mostrarem imagens do bairro, das demolições, entrevistando moradores, vizinhos, comerciantes, autarcas, assistentes sociais, dirigentes associativos, líderes partidários, polícias, membros de Igrejas, etc.

Entretanto, o Bairro do Talude foi perdendo interesse à medida que o drama das urgências hospitalares ia subindo de tom. Nesse momento, os jornalistas trasladaram-se para as portas dos hospitais para dar nota de manhã à noite quais as Urgências que não funcionam, as que vão ser encerradas, os diretores clínicos que se demitiram ou os utentes que bateram com o nariz na porta. Tudo, acompanhado por um cortejo de diretos com entrevistas a médicos, enfermeiros, utentes, dirigentes sindicais, responsáveis do Ministério da Saúde, do SNS, mais os líderes partidários do costume e autarcas também. Paralelamente, os comentadores residentes dos canais e mais os comentadores convidados, iam debitando opiniões mais ou menos fundamentadas, verdades de La Palisse e, em muitos casos uma propensão para a sua inclinação ideológica.

Este programa televisivo era episodicamente temperado com o início do julgamento do ex-primeiro ministro José Sócrates, com os diretos diários das audiências e da guerra surda que o mesmo vem travando com o coletivo de juízas e com o Ministério Público. Outra especiaria que apimentou este período foi o julgamento relativo ao processo que “Os Anjos” moveram à humorista Joana Marques que também fez as delícias televisivas. 

Subitamente já estamos em agosto e, como é sabido, neste mês para tudo e finalmente o país lembra-se que existe um interior profundo e as televisões mudam-se de armas e bagagens para Pinhel, Vila Real, Sertã, Mangualde, ou para qualquer outro lado onde haja pinheiros e eucaliptos que ardam. É neste preciso momento que desligo o aparelho que tenho na sala que passa a constituir um adereço mudo e negro no meio da sala. Porque fui de férias? Não, porque começaram os incêndios de Verão com o cortejo de horrores da floresta portuguesa novamente (??) a arder e os pirómanos do costume a brincar ao gato e ao rato com a GNR, a PJ e os Bombeiros, enquanto as antenas de TV deliram com as imagens dantescas das chamas a avançar e os populares a tentar salvar o seu património.

Mas eis que também agosto termina e que novo “prato” televisivo vai ser servido? A tragédia do Elevador da Glória que vitimou 16 pessoas em Lisboa no passado dia 3 de setembro (curiosamente dois meses exatos volvidos sobre o acidente que vitimou o futebolista Diogo Jota e que também garantiu longos dias de programação barata à custa da desgraça alheia). Concluo perguntando se existe uma relação de causalidade entre tudo isto e o elevado número de pessoas que sofrem de depressão no nosso país?

Fernando Viana

Fernando Viana

13 setembro 2025