Somos claramente um país pequeno com óbvia falta de meios e recursos económicos, financeiros e sociais; e esta situação de aperto e carência já vem de muito longe e pega-se-nos à pele como praga ou doença incurável que mexe com as estruturas empreendedoras, produtivas e, até, morais.
Todavia, esta infausta circunstância não impede que sempre procuremos viver acima das nossas possibilidades efetivas; e isto, já em tempos recuados, levou Mário Soares a afirmar que Portugal vive acima das suas possibilidades pelo que é preciso apertar o cinto.
E efetivamente ele se apertou, pois este handicape entre o excesso de fome e a escassez de pão fez com que, perante a ameaça de bancarrota, tivéssemos de recorrer ao Fundo Monetário Internacional (FMI) de chapéu na mão e mão estendida em 1979 e 1980 com governos de Mário Soares e em 2011 de José Sócrates; e, nesta última situação, o Partido Socialista (PS), apoiante natural do governo, não quis assumir a culpa da possibilidade de bancarrota se centrar na governação, mas na conjetura económica internacional.
Pois bem, a política que tem sido desenvolvida pelos diferentes governos não me aprece adequada à situação nacional, baseando-se mais na mentaria e na demagogia do que no rigor e na verdade; e, assim, frequentemente, no Parlamento a preocupação dos partidos é mais com a apresentação e aprovação de projetos e medidas fraturantes e avulsas, em vez de projetos e medidas estruturais e imprescindíveis para o desenvolvimento económico e social do país.
Por exemplo, a aprovação da despenalização do aborto e da eutanásia e a criminalização dos maus tratos e do abandono de animais a juntar ao consentimento do casamento entre casais homossexuais e outros temas menores, em nada melhorou as condições degradantes que se vivem na Saúde, na Educação, na Justiça, na Segurança Social, no desemprego, nos salários e na precariedade laboral; e esta situação só vem demonstrar que o caminho que politicamente tem sido seguido nada ou pouco tem a ver com a Política como ciência e arte na sua génese e pureza; o que significa que como arte o seu objetivo deverá ser o de fazer e agir e como ciência ligada deverá estar à história, à economia, à sociologia, à geografia e à psicologia individual e social com evidentes preocupações e objetivos no bem-estar e felicidade pessoal e social do povo.
Daqui se infere que o regime político ótimo seja aquele que, buscando servir o homem todo e todo o homem melhor se adapte, aqui e agora, às realidades de um povo e duma sociedade; e muito longe das formas de governação dos estados que, na Antiguidade, os Escolásticos (Platão, Aristóteles, Zenão de Cítio e Políbio), definiram assim: a monarquia deteriora-se em tirania, a aristocracia degenera em oligarquia e a democracia afunda-se em demagogia.
Então, para moralização da vida política nacional, o que se exige é a formação de uma nova classe de políticos sujeita a um código de conduta exigente e séria; e, só desta forma, a renovação, credibilização e morigeração da democracia se tornam possíveis, assentando na dignidade, competência e estadismo de todos os seus dirigentes.
Para isso, de qualquer líder político se exige que seja coerente, sincero e não fingido; que seja apaixonado e competente naquilo que faz; que seja experiente e realista para mostrar que os projetos e propostas que abrace não sejam utópicas nem demagógicas e se centrem nas necessidades, carências e anseios do povo real que representa; que seja abnegado e faça do espírito de bem-servir e de doação aos outros o seu código de honra e conduta perante o povo.
E, sobretudo, que faça da política a arte de servir os outros e as instituições que representa ou dirige e não a arte de se servir a si próprio, aos seus amigos e correligionários; e que é, infelizmente, o que mais tem acontecido com muitos políticos ao longo dos muitos anos que já levamos de vida e prática democrática, arrastando e mantendo, assim, o país na endémica situação de carência de meios e recursos, bem como de justiça e verdade sociais.
Então, até de hoje a oito.
Autor: Dinis Salgado
Uma nova classe política
DM
11 março 2020