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O (devastador) percurso da pandemia está a ser longo e sumamente doloroso.
Sabemos que a «tempestade» há-de passar. Mas até chegar esse momento, a humanidade estará submetida a um arfante estendal de sofrimento.
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Estamos perante uma dantesca crise sanitária. Mas que acaba por arrastar uma profundíssima crise económica, social, institucional, relacional e até afectiva.
Já são localizáveis marcas desmedidas nas pessoas, nas empresas e nos relacionamentos.
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Há quem já esteja no desemprego. Há muitos que já não se subtraem à fome. Enfim, há vidas que estão a ser devoradas pelo desespero e torturadas pela solidão.
Esta é, pois, uma «multicrise», que não deixa ninguém de lado e que nos coloca a todos em risco.
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Desta «multicrise» faz parte uma menor atenção dispensada a quem padece de outras patologias e a quem está afectado por outro género de problemas.
Acresce que, além do que estamos a fazer, somos sobressaltados pela inquietação acerca do que será o melhor para realizar.
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Quando tudo passar, vamos sentir uma infindável sensação de alívio. Mas tal sensação não repõe as vidas que foram consumidas pelo novo coronavírus e por outras enfermidades.
Os efeitos da pandemia – coligados com as consequências de algumas medidas – estão a arrastar muitos para a contestação e inclusive para a violência.
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Afinal, a humanidade, que tanto avança no conhecimento de um universo infinitamente grande, vê-se a colapsar perante um tortuoso organismo, infinitamente pequeno.
É notória a incerteza e cada vez mais visíveis as explosões de revolta. Todos parecem ter razão e quase ninguém parece conseguir manter a racionalidade.
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Também nós, cristãos, nos descobrimos, por vezes, a trilhar terrenos pouco seguros. A fé não nos retira humanidade. Sentimos – e sofremos – com todos e como todos.
No fundo, nem nos podemos ver ou tocar. Os rostos como que nos surgem embaciados pelas máscaras e a proximidade pode transportar um perigo. Enquanto seres sensitivos, estamos impedidos de expressar plenamente o que nos vai na alma.
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Que fazer? Não podemos optar por constituir uma «Igreja inactiva». Mas temos de procurar oferecer algumas «práticas alternativas».
Nesta hora, o nosso primeiro grande dever é proteger. Não se trata de ficar imobilizado, mas de agir com prudência, oferecendo acolhimento e solidariedade.
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Temos de perceber que também necessitamos de «mártires vivos». Uma coisa é não fugir da ameaça; outra coisa, é procura-la deliberadamente.
A Igreja – desde a antiguidade – nunca aprovou a «jactacio martyrii». Definitivamente, a temeridade não é opção para um cristão.
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Temos de encontrar formas – nas celebrações e nos contactos que possamos ter – de oferecer esperança.
Para uma «multicrise», uma «multi-esperança». É nosso dever e é a maneira de melhor proteger. Deus continua presente na nossa história. E sobre cada sofredor Ele derrama copiosas torrentes de amor!
Autor: Pe. João António Pinheiro Teixeira