No capítulo seguinte do mesmo livro, porém, vemos Deus dizer com severidade ao pai da humanidade: “(...) a terra será maldita por tua causa; com trabalho penoso, tirarás dela o alimento todos os dias da tua vida, (...) comerás o pão com o suor do teu rosto (Gén 3, 17.19). A situação é bastante diferente: o ser humano vai sentir o rigor das tarefas profissionais. O seu pão será conquistado quotidianamente com muito esforço, num cansaço constante, que nem sempre terá a recompensa almejada, pois a terra passou a ser maldita.
Esta nova situação deveu-se, como é sabido, ao facto de o homem se ter sobreposto a Iavé, descurando os seus conselhos, pondo em causa o seu amor, duvidando da verdade das suas indicações e desejando tornar-se um ser completamente autónomo. Isto é, esquecendo a sua condição de criatura e de quem o criou, que foi Deus. A esta atitude sobranceira costuma designar-se como pecado original, segundo a linguagem de Santo Agostinho.
E, realmente, o mundo do trabalho, com frequência, manifesta este desconcerto humano. Ouvir falar alguém que ganha o seu pão numa empresa – privada ou pública –, nem sempre nos anima a olhar para a nossa condição laboral com alegria. Há despeito pelo companheiro que é protegido e sobe na carreira, há desconfiança em relação ao chefe que não valoriza o seu esforço no desempenho das suas obrigações, há suspeições por aquele que, a seu lado, foi falar com os superiores e, logo a seguir, veio para si uma recriminação por alguma falha niquenta e inofensiva, compara-se a quantidade e a qualidade dos tempos de labuta entre uns e outros e sempre se descobrem surpresas negativas só possíveis pela lei da “cunha” ou até do nepotismo.
Enfim, o mundo laboral não deve assemelhar-se a uma praça de toiros, onde o profissional é lidado e bandarilhado por todo o escol de injustiças e incompreensões. Os que convivem nesse universo tristonho, mais do que colegas, apresentam-se como concorrentes que se olham com desconfiança e cautela. Aceitar este ambiente recorda-nos as palavras de Iavé atrás citadas: trabalho penoso.
Ao cristão compete levar a estas circunstâncias a lei da caridade. Pode ser árduo e, até, difícil. Mas é a mensagem que Cristo lhe ensinou a viver e para a qual deixou, ao redimir-nos, um manancial de graça superabundante. Não se esqueça, no entanto, que nestes meios a exemplaridade tem duas condições fundamentais: a competência e a honestidade.
Um cristão tem de ser modelar. Certamente, de acordo com as suas possibilidades naturais e a ajuda sobrenatural que a graça lhe confere. Fugir destes parâmetros é sempre um péssimo serviço que se presta a Cristo.
Pelo contrário, se a lei da caridade preside ao mundo das suas incumbências profissionais feitas com competência e honestidade – insiste-se –, poderá topar alguns dissabores, mas acabará por descobrir nos seus colegas amigos a quem compreende, com quem é afável, sabendo exigir e aconselhar. Mais ainda: santifica-se.
Autor: Pe. Rui Rosas da Silva