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Ser servido ou ser usado?

1. Duas obsessões dominam a sociedade de hoje: o crescimento económico e a produção. O ser humano é convertido em máquina. Quem deixou de produzir, como sucede com os idosos, arruma-se. E começando a dar muita despesa… vão falando na criminosa hipótese da eutanásia. 2. Para que haja crescimento económico e produção é necessário estimular o consumo. Não se produz para armazenar, mas para vender, com lucro. Então, faz-se toda uma campanha publicitária e propagandística no sentido de levar as pessoas a adquirirem o que se produziu. Se têm ou não possibilidades económicas, não importa. Se vão ter de se endividar a fim de poderem adquirir novos artigos, para quem vende isso não conta. O importante é que comprem e paguem, ou deem garantias válidas, que isso de vender e não receber não dá lucro. 3. Uma coisa me parece necessário reter: fazendo passar a ideia de que serve as pessoas, proporcionando-lhes comodidade e bem-estar, a sociedade de consumo serve-se delas. Usa-as. Cria nelas necessidades artificiais. Leva ao amontoar do supérfluo. 4. A sociedade de consumo é a promotora do usa e deita fora. É a sociedade do descarte, que insistentemente denuncia o Papa Francisco. E a mentalidade do usa e deita fora tanto atinge as coisas como as pessoas. Também há seres humanos que, depois de usados, são postos de lado. Não será isso, por exemplo, o que se passa com alguns casais, onde, depois de usadas, as pessoas são trocadas por outras com a maior das facilidades, sem atender à situação de quem, depois de usado, foi preterido ou arrumado? 5. Entre as pessoas usadas pela sociedade de consumo encontram-se os jovens, olhados como fonte de lucro. São eles, por exemplo, o alvo preferido pelos narcotraficantes, que os convencem a experimentarem novas sensações, à custa de produtos de que vêm a ficar dependentes, alimentando um negócio que não devia existir, por prejudicial que é ao consumidor e não só. Para seduzir os jovens a sociedade de consumo inventa festas e diversões. Persuade-os de que é necessário gozar a vida, sem atender à liceidade ou moralidade das diversões que proporciona. E surge uma variedade de negócios ligados à noite onde, a pretexto de viverem umas horas de convívio, os jovens passam a consumir coisas dispensáveis, se não prejudiciais, para que outros possam faturar. A sociedade de consumo inventa festas de fim de curso, onde a pretexto de servir os jovens se serve deles. Inventa festas de aniversário que, em vez de serem celebradas em casa, no convívio da família, são-no em ambientes habilidosamente preparados, onde, sob a capa de proporcionar aos aniversariantes um ambiente de alegria, alguém aproveita a oportunidade para encher o bolso. E o que se passa com o casamento? Quantas coisas inventa a sociedade de consumo, desde a qualidade dos convites para a celebração e às despedidas de solteiro até à organização do banquete, onde se apresenta um conjunto de bugigangas que podem ser agradáveis à vista mas de nenhuma utilidade? Tudo isso, porém, é objeto de negócio e fonte de lucro para alguns. 6. Este afã de lucro invadiu até celebrações religiosas, que deveriam primar pela simplicidade mas se rodeiam de festarolas e de vistosas toiletes onde há sempre quem fature. Veja-se o que acontece, por exemplo, com batizados e primeiras comunhões. O afã do lucro invadiu, até, momentos da vida que deveriam ser respeitados por todos, como são os funerais. Também há quem os aproveite para fazer prosperar o seu negócio. 7. Não quero ser exagerado, mas estou persuadido de que, a pretexto de sermos servidos, todos nós, de uma forma ou outra, somos usados e explorados. Isto exige que andemos atentos. Que ponhamos em ação o sentido crítico. Que nos não deixemos levar pelo agora usa-se, a moda é esta, se não se faz parece mal, o nosso vizinho fez assim e nós não vamos ficar atrás… Cada vez mais se impõe a necessidade de nos governarmos pela própria cabeça, de não irmos na onda, de termos a coragem de sermos diferentes, de distinguirmos as verdadeiras das falsas necessidades, de nos não deixarmos levar pelo que, habilidosa e interesseiramente, nos impingem.
Autor: Silva Araújo
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26 abril 2018