O HPV - Vírus do Papiloma Humano está associado a vários cancros no homem e na mulher (pénis, ânus, cabeça/pescoço, vulva, vagina), porém, como Ginecologista, quero-vos falar do impacto deste no colo do útero. Para melhor visualizarem, imaginem que o útero é uma garrafa ao contrário, em que o gargalo corresponde ao que chamamos de colo. A presença deste vírus no colo é condição “necessária” para o desenvolvimento de lesões pré-cancerosas, que em alguns casos evoluem para cancro.
O cancro do colo uterino constitui atualmente um dos maiores problemas de saúde pública a nível mundial (aproximadamente 500.000 novos casos/ano). Na mulher é o 4.º tipo mais frequente. Em Portugal existem cerca de 750 novos casos/ano com uma mortalidade de 3,9/100.000. Em 2017 matou 210 mulheres (23,3% entre os 20-49 anos e 49% com mais de 65 anos).
A evolução da infeção à doença é muito lenta e geralmente não dá sintomas (anos ou décadas entre o início da infeção e o desenvolvimento de cancros) passando por diversas fases. Existem mais de 200 tipos de HPV dos quais cerca de 40 infetam, preferencialmente, o sistema anogenital (vulva, vagina, colo do útero, pénis). Destes, 14 são de AR - alto risco, ou seja, são carcinogénicos (conseguem estragar as células até se transformarem em cancro).
São das infeções de transmissão sexual mais comuns (durante o sexo vaginal, oral, anal ou durante o contacto íntimo de pele com pele entre pessoas em que pelo menos uma esteja infetada). Aproximadamente 80% dos indivíduos adquirem a infeção nalguma altura da sua vida, mas a maioria resolve espontaneamente (≈90%) e só raramente persiste (≈10%). O preservativo reduz significativamente a transmissão, mas não a 100%.
Alguns fatores aumentam o risco de infeção persistente e a progressão para cancro: serótipo do vírus, tabagismo, imunossupressão, início precoce da atividade sexual, múltiplos parceiros sexuais (contudo, basta ter tido apenas um único parceiro sexual durante toda a vida para se poder estar infetado).
Atualmente existem duas vacinas contra o HPV: Cervarix® (2 serótipos) e Gardasil-9® (9 serótipos). Esta última é administrada gratuitamente às jovens de 10 anos através do Programa Nacional de Vacinação (prevê-se que os rapazes também sejam incluídos brevemente), podendo contudo ser adquirida nas farmácias pelos restantes grupos etários.
A chave é as mulheres realizarem o rastreio regular (com a pesquisa do HPV AR e/ou teste Papanicolau) num programa de rastreio organizado ou de forma oportunista (mesmo as vacinadas). Independentemente da sua orientação sexual ou mesmo que não tenham atividade sexual há muito tempo.
A pesquisa do HPV AR permite identificar as mulheres infetadas e com potencial de desenvolver lesões pré-malignas ou malignas. Por sua vez, o teste Papanicolau (citologia cervical ou colpocitologia) é realizada com a finalidade de detetar a presença de lesão provocada pelo vírus, ou seja, células pré-cancerígenas e cancerígenas nas secreções cervicais.
A combinação da vacinação contra o HPV e o rastreio têm o potencial para eliminar o cancro do colo do útero no futuro.
Com um simples exame podemos salvar vidas…a sua, da sua filha, da sua mulher, da sua mãe, da sua avó, de uma amiga. Que a falta de tempo ou o medo não vos impeçam de consultar o vosso médico e ganhar anos de vida, que merece ser vivida. Para bem da sua saúde confirme quando fez (fizeram) o último Papanicolau!
Autor: Cátia Correia