Portugal goza do privilégio de poder dar prioridade, neste domingo, 2.º do Advento, à celebração da Imaculada Conceição, pois é a Padroeira principal de Portugal. Todavia, deve observar 3 condições: a) a segunda leitura (Rom 15, 4-9) é tomada do 2.º Domingo, e não a que consta no ordenamento das leituras para a festa da Imaculada (Ef 1, 3-6. 11-12); b) a oração conclusiva da Oração Universal deve ser a da colecta do II Domingo de Advento; c) a homilia deve falar também do tempo especial que estamos a viver, o Advento. Tempo de esperança por excelência, mais ainda à luz de Maria 'causa da nossa alegria'.
Júnior Sarmento, a personagem principal do livro de João Aguiar: Morri ontem, afirma a certa altura que a Igreja Católica explica «mal quase tudo o que ensina ou propõe». Afirma ainda que seria bom que nos Seminários se ministrassem noções básicas de comunicação, marketing e, essencialmente, bom gosto. (Cf. p. 80)
A vida do cristão consiste em viver do mistério de Cristo, isto é, daquela salvação que, em Jesus de Nazaré, se tornou presente na História e na vida da Humanidade. E o mistério de Cristo é celebrado e vivido sacramentalmente como memória, presença e antecipação profética. A Igreja distribui os seus vários momentos pelos dias, estações e anos nos quais se realiza a existência dos seres humanos.
O ano litúrgico principia com o Tempo do Advento, o tempo que celebra todo o mistério da vinda salvífica do Senhor: a entrada na História, em Belém, do Verbo que se fez carne e veio habitar no meio de nós; e a vinda gloriosa no fim dos tempos, pois o cristão vive na expectativa de que se cumpra a feliz esperança e venha o nosso Salvador Jesus Cristo. Não se pode esquecer que: a) entre o já de uma salvação que se realizou em Cristo (a primeira vinda) e, b) o ainda não da sua plena e definitiva manifestação, se dá: c) a 'vinda intermédia', da qual o ano litúrgico, com as suas celebrações, é lugar privilegiado de celebração, interiorização, aprofundamento e vivência.
Acontece que estamos demasiado habituados a entender por Advento a vinda ou chegada, e por isso consideramos este tempo como preparação para o nascimento de Jesus, ou Natal. Todavia, a palavra advento não era entendida como poderíamos esperar – a chegada do Filho de Deus ao mundo, o dia do Seu nascimento –, mas, sim, o seu aparecimento na glória.
Hoje, nós não esperamos a vinda do Messias – que já apareceu em Belém há mais de 2 mil anos –, mas a sua manifestação cada vez mais apelativa ao Mundo. E é neste sentido e perspectiva que adquire sentido o tempo que dedicamos à preparação do Natal, tempo que, mais do que «Advento», deveria ser chamado «Preparação para o Advento», pois que o Advento é o nosso futuro, como o traduzem muito bem as palavras «avvenire», em italiano, e «avenir», em francês. Isso permite que viremos a nossa atitude espiritual de uma 'espera' para uma 'marcha': não é Ele que vem (pois já veio!, já está aqui!); somos nós que vamos, que caminhamos para o futuro. Não esperamos que chegue até nós, 'até aqui'. Somos nós que vamos para lá. Dizia-o muito bem a oração colecta do primeiro domingo: « Despertai, Senhor, nos vossos fiéis, a vontade firme de se prepararem.. para ir ao encontro de Cristo».
Advento não é tempo para ficar sentado à espera, mas para adiantar caminho procurando o Seu encontro. É isso que faz Maria depois de o Anjo lhe dizer que vai ser Mãe do Altíssimo. Põe-se a caminho e vai dar o grande anúncio a sua prima Isabel: a quem Deus também garantiu futuro, permitindo que gerasse o Precursor, quando todas as leis da natureza o tornavam humanamente impossível.
O tempo de Advento é tempo de proclamar e viver que existe futuro, mas que não podemos esperar de braços cruzados. Este é um tempo para agir, sabendo, porém, que é sempre Deus que age em nós, se mostrarmos a disponibilidade que Maria manifestou: «Faça-se em mim segundo a Tua Palavra».
A Cheia de Graça, como A saúda o Anjo, indica que Ela atingiu a plenitude da salvação desde o primeiro momento da sua concepção. Depois, é Ela que, com a sua resposta humilde e de total disponibilidade, se torna plenamente digna de tal chamamento e graça. Mas a iniciativa é de Deus. É Ele que A busca por intermédio do arcanjo Gabriel; é Ele que A escolhe para a mais alta missão que uma criatura humana pode desempenhar; é Ele que A torna Santa, porque só Deus A pode recriar nova, libertando-A da escravidão do mal a que a humanidade, por livre escolha, se submeteu. Agora, também por livre escolha, Maria acolhe a Graça. É a Cheia de Graça. O Espírito Santo desceu sobre Ela e a força do Altíssimo estendeu sobre Ela a sua sombra. Por isso, Aquele que dela vai nascer é Santo e será chamado Filho de Deus.
A Bíblia coloca em paralelo Eva - sinónimo da estrada que o mal percorreu para entrar no mundo – com Maria – a estrada que Deus escolheu para fazer entrar 'a graça', isto é, o amor e a santidade no mundo. Isto é dito de maneira muito bela na oração colecta da festividade que celebramos este domingo, pois que Deus quer que nos salvemos, e que não sejamos vítimas do mal.
Cantemos com júbilo: 'Salvé, Nobre Padroeira..»
Autor: Carlos Nuno Vaz