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Postal de Natal

Amanhã é a grande noite, noite de família, noite silente: por aqui nos deveríamos ficar porque os silêncios ganhariam o espaço íntimo de quem não apenas se lembra, mas também recorda. Lembrar basta ter memória e recordar precisa de ter coração. E este só existe e perdura em quem ama. Amar o Natal é beber no vaso velho o vinho novo, isto é, é ir buscar a alegria do passado e juntar-lhe a alegria de hoje. Olho e vejo a minha mesa cheia: os filhos, os genros, a nora, os netos e fico-me a pensar neste ditado: quem nada cria, nada tem. E eu tenho esta família e sinto-me como semeador que colheu das sementes os belos frutos de que hoje desfruto. Penso e digo, não quero que este tempo acabe. Os mais novos já não jogam aos pinhões e manejam os teclados dos telemóveis com a mesma presteza que eu movia o rapa. São os tempos e não há que comparar. Já passou o tempo em que a neta me dizia, “avô conta-me a história do nascimento do Menino”. E eu contava, embevecido por ser solicitado e desfrutando uma vez mais da magia desse nascimento. Agora sou eu que lhe peço, “vem ajudar-me a mandar estes mails ao teu tio que está em Lisboa, à tua tia que está no Porto, ou aos teus primos que estão em Felgueiras”. E ela vem rápida e solícita, com a mesma boa disposição de quando era ela a ensinada. Não há choque de gerações a não ser o que os mais velhos provocam. Gosto do futuro com gosto dos rebentos novos de cada primavera. Há quem resmungue por eles ficarem no teclado tanto tempo! Eu não interfiro na educação dos netos, mas penso que os meus filhos, por vezes, são mais velhos do que eu; eles não vêem que os filhos estão a viver o seu tempo como eles viveram o deles. Os outros netos chegam-se e olham os mails e sugerem como os posso mandar todos de uma só vez e, à minha satisfação calada, embora exultante de alegria interior, junta-se-lhe a vontade de gritar aos que não querem filhos por egoísmo: venham ver esta fartura de natal. Natal é mais que um nascimento, é um renascimento; por causa disso é que todos os anos o nascimento de Jesus renasce em nossas almas. Olho para o meu pequenino presépio na representatividade da Sagrada Família e vejo sorrir o Menino na suas palhinhas, Nossa Senhora tem um ar mais mãe e S. José um aspeto mais venerando. Certamente é fruto desta imaginação criada por esta noite de anjos que a estrela pirilâmpica ilumina do cimo da cabaninha como que a dizer, aqui acaba o meu caminho e começa o vosso. Desejo a todos uma noite de paz e um feliz dia de Natal.
Autor: Paulo Fafe
DM

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23 dezembro 2019