Alguns exemplos do atropelamento das respostas a esta questão são evidentes em Pascal, quando este afirma: “é incompreensível que Deus exista e incompreensível que não exista; que a alma seja com o corpo, que não tenhamos alma; que o mundo seja criado, que o não seja, etc.” Este etc, diz Anselmo Borges, não tem fim, incluindo também ser incompreensível que haja vida depois da morte e que com a morte acaba tudo.
Pergunta Tolstoi, pela boca de Ivan Ilitch, moribundo: “Onde é que estarei quando cá não estiver?” Perguntava o filósofo B. Welter: “Para onde vão os mortos? Para o silêncio? Para o nada?”
“É este nada que a todos espera. Ninguém lhe pode escapar. E não há ninguém que alguma vez tenha voltado”…E continua Anselmo Borges:
…“Porque é que há algo e não pura e simplesmente nada? Este nada é pura e simplesmente nada, e assim tudo é sem sentido último ou, pelo contrário, o Nada experienciado na morte é a figura do Mistério oculto que a tudo dá sentido e fundamento?”
Que a morte é um facto natural, é-nos testemunhado pelas respostas evidentes da inteligência sensorial, relativamente ao mapa da necrologia. Há quinze dias, cumprimentei, auspiciosamente, fulano de tal. Oito dias depois assisti-lhe à missa de sétimo dia. Repousa no jazigo de família.
Afinal, para lá da ausência e do sofrimento, o que é a morte? Vou passar por cima das reações familiares, dolorosas ou não; vou passar por cima das reações sociais, políticas, económicas, culturais ou religiosas...
O que é, então, a morte? Vou ao fundamental. Depois de passar, com os dedos, como faz o exímio pianista, pelo teclado da inteligência existencial (sensorial, emocional, racional) para o teclado da inteligência transcendental e desta para a inteligência transcendente (a Divina), vou afirmar que a morte, como um facto natural, pensando bem, outra coisa não é senão a libertação do processo existencial do nosso ôntico ser transcendental para o ôntico e Transcendente ser Divino.
Repetindo o que já afirmei noutro artigo: O nosso processo existencial, inerente aos fatores biopsíquicos (corpo e alma, intrinsecamente unidos), tem o condão de nos oferecer, através da morte, a libertação do nosso ôntico ser (transcendental, uno e relacional), do seu natural processo, para a sua integração e congruência na vida, no amor, na luz, na justiça, na beleza e todo o bem no ôntico e transcendente Ser Divino.
Bem-haja, para todo o homem, a natural, a gratificante e a libertadora morte, através da cultura existencial das bem-aventuranças, explicitadas nos imperativos transcendentais.
Autor: Benjamim Araújo
Para onde vão os mortos?

DM
13 setembro 2017