Este artigo começa com uma pequena história. Por um destes dias, em casa de um velho amigo, verifiquei que já tinha feito o presépio. Quis vê-lo de perto. E reparei numa falta imperdoável. Não estava S. José entre as figuras tradicionais. Pensei em várias hipóteses para justificar essa ausência.
Mas o meu amigo antecipou-se: “Vejo, pela tua cara, que andas à procura de S. José. Não foi esquecimento. Já esteve aí... Mas o meu neto mais novo, o Filipinho, há perto de uma hora, pegou na sua imagem e perguntou-me, com a curiosidade dos seus oito anos: “Ó avô, o S. José não era bem pai de Jesus, como eu sou do teu filho Ricardo...” Ao perguntar-me isto, levantou a imagem, tropeçou no tapete, caiu ao chão e o S. José ficou feito em fanicos..… Tenho de comprar outra imagem...”.
Não duvidei por um momento de que o meu amigo – um bom cristão – quisesse retirar S. José do presépio. E a sua boa vontade de comprar uma nova imagem, depois de ver a que já tinha feita em “fanicos”, isto é, absolutamente imprópria para receber um restauro cuidado, só me fez recordar, por um lado, a sua consideração pelo marido de Nossa Senhora e, por outro, que a sua ausência daquele presépio, de certo modo, me levava a pensar na menor importância que se lhe atribuiu durante muitos séculos da vida da Igreja.
E agradeci a Santa Teresa de Ávila a sua devoção tão robusta a S. José, pois muito contribuiu para o colocar entre os maiores santos a que os cristãos podem recorrer.
Lembrei-me ainda de que, nos textos dos Evangelhos, não há uma única palavra proferida no discurso directo saída da boca de S. José. É que de facto, para se ser santo, não é preciso dizer nada que não seja absolutamente necessário.
O importante é fazer a vontade de Deus. E toda a vida deste homem, simples e humilde, ainda que descendente do Rei David, não foi outra coisa do que cumprir, sem alarde e com a maior fidelidade, aquilo que Deus lhe ia pedindo com um à vontade e uma exigência de quem sabe que será sempre atendido da melhor forma nas suas solicitações, apesar de lhe exigir uma resposta tantas vezes heróica e dura, rápida e silenciosa.
Que S. José tudo tenha feito para que a honra de Maria não fosse beliscada ao regressar da sua estadia em casa de Santa Isabel, calando a surpresa de a ver grávida, e prontificando-se a sair de cena, para que a sua presença não pudesse prejudicar minimamente o que estava a ser gerado no seio da Virgem Santíssima, é heróico.
Certamente que Deus o tranquiliza com o aparecimento do anjo que lhe revela a plenitude do mistério da concepção de Jesus e o convida a ser o seu pai legal.
No entanto, algum tempo depois, já com o nascimento do Messias consumado e a sua vida de chefe de família recém-organizada em Belém, de novo o anjo lhe aparece e lhe diz taxativamente que, de forma imediata, fuja para o Egipto. José obedece, porque, perante o que Deus lhe pede, não hesita em cumprir.
A ele, porém, compete arranjar apressadamente tudo para que o seu rasto e os de Maria e de Jesus não sejam descobertos pelos soldados de Herodes. Vai pensando como sustentar a sua esposa e o seu Filho, onde poderá arranjar um pé-de-meia mínimo à custa do seu trabalho, para o sustento de todos num ambiente novo e desconhecido.
Como deve ter agradecido então o oiro deixado pelos Magos!... E compreende que, mau grado tanta aflição, Deus não se esquece de quem Lhe é fiel...
Daí, também que, alcançado o mínimo de estabilidade no Egipto, não titubeie quando Deus o informa de que é tempo de voltar para Israel. José regressa imediatamente. Mais uma vez manifesta a sua inteira disponibilidade. Instala-se em Nazaré, aí exerce o seu trabalho de carpinteiro, segundo a tradição. Vê crescer Jesus, maravilhado.
Mas não o encontramos em nenhum momento da sua vida pública. José foi necessário para o nascimento de Jesus, o seu sustento de infância, a sua aprendizagem da “arte”de carpintaria e o seu crescimento humano. Um Jesus adulto, ciente da sua missão, já não necessita desse modelo tão paternal. José desaparece silenciosamente.
Fez sempre o que Deus lhe havia destinado e só isso o ocupou.
Autor: Pe. Rui Rosas da Silva
No Presépio de Belém (I) – S. José
DM
9 dezembro 2017