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Na União Europeia, sem amor

Todavia, pelo Tratado de Roma, em 1957, a Comunidade passa a designar-se Comunidade Económica Europeia (CEE), hoje União Europeia, e vê-se, a partir desta data, reforçada com entradas sucessivas de novos países; e é, então, em novembro de 1985, assinado, pelo primeiro-ministro Mário Soares, o ato de adesão de Portugal que se concretiza, em janeiro de 1986, com a sua passagem a Estado-membro. 

A partir desta data e até à composição que hoje tem – 28 membros ainda com a Inglaterra – a União Europeia sofre profundas transformações: criação da moeda única – primeiro o Ecu e agora o Euro –, aprovação do Tratado de Maastricht, abolição das fronteiras, criação do Banco Central Europeu e do Mercado Único; e é, em janeiro de 2002, que se inicia a circulação das moedas e notas comuns, para, em julho, terem curso legal e sendo, assim, autorizadas como único meio de pagamento no conjunto dos países que as adotam.

Pois bem, quando Jean Monnet traçou o famoso Plano de Ação, a partir da Declaração de Schuman, longe estava de pensar que a Comunidade Europeia com que sempre sonhou –solidária, unida, cooperante — não é a União Europeia que hoje temos. Sem dúvida que o sonho de Monnet ainda longe está de se concretizar, porque à solidariedade se sobrepõe o individualismo, à unidade se sobrepõe a diversidade e à cooperação se sobrepõe a desunião, gerando uma União Europeia de ricos e de pobres; e onde o espírito mercantilista, monetarista, economicista e tecnocrático é que dita as regras do mercado e da convivência. 

Temos tido, pois, uma União a duas velocidades, onde os países mais pobres, mais atrasados e culturalmente mais débeis se endividam e sofrem os efeitos de sucessivas medidas de austeridade, não se desenvolvendo, nem crescendo ao desejado ritmo o que os leva ao colapso do sistema bancário, ao aumento da dívida, do défice e da pobreza; e neste grupo se enquadram Portugal e as democracias do Sul da Europa. 

Mas, então, porque está a falhar o Projeto Europeu no Sul da Europa? Sobretudo, porque a unidade política, económica, financeira e cultural entre todos os membros da União não existe; e cada vez mais se acentuam as assimetrias políticas entre as democracias do Norte e Centro e as democracias do Sul a que se vem juntar o ressurgimento dos nacionalismos um pouco já por toda a Europa. 

Depois, a Europa do Sul nunca traçou dentro da União o seu próprio caminho, a sua identidade e originalidade; e o que efetivamente tem feito é copiar, tentar adotar o modelo que funciona bem nas democracias já muito estruturadas, sólidas, aperfeiçoadas e modernas; e, pior ainda, impô-lo à sua realidade, idiossincrasia e matriz cultural; e, até, aos ecossistemas que tão diferentes e caraterísticos são entre o Norte e o Sul europeu. 

Por exemplo, sabemos que os países do Sul, dadas as suas singularidades psicológicas, psicossomáticas e geográficas, são mais expansivos, mais abertos, mais dados aos prazeres da vida, ao dolce farniente latino; e esta realidade dificilmente encaixa nos padrões de austeridade que a União lhes estabeleceu; e, daí, os problemas económicos, sociais e as crises financeiras que têm suportado e sofrido. 

Pois bem, a União Europeia é formada por um grupo de países desiguais na sua grandeza territorial, cultural e demográfica, na sua capacidade produtiva, empresarial e tecnológica, no clima, na legislação laboral, na riqueza; e os seus cidadãos não falam a mesma língua, não têm a mesma religião e cultura; e, até, entre eles existe um passado de confrontos ideológicos, políticos e culturais. 

E, assim, Portugal, como consequência desta realidade, do orgulhosamente sós doutros tempos, passou ao tende piedade de nós que é o apelo que os sucessivos governos vão fazendo à União Europeia; e isto devido às constantes derrapagens económico-financeiras que já nos puseram à beira de três bancarrotas, levando-nos a estender a mão aos credores e, consequentemente, à criação de uma monumental dívida que os nossos netos e bisnetos, sem culpa alguma, terão de pagar. 

O que nos leva logicamente a concluir que estamos na União Europeia, sem amor.

Então, até de hoje a oito.


Autor: Dinis Salgado
DM

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8 março 2017