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Flores do verde pino

Apesar desta azáfama toda, sobravam-lhe horas para se dedicar à lírica trovadoresca. Enquanto a nossa rainha gerava rosas no regaço, D. Dinis ia compondo, com mérito, algumas cantigas. Na mais famosa das cantigas de amigo, pergunta a mulher apaixonada: Ai ?ores, ai ?ores do verde pino Ai, ?ores, ai, ?ores do verde pino, se sabedes novas do meu amigo?

Apesar de se terem acabado os reis e as rainhas com tempo para tudo, as flores do verde pinho ficaram por cá. Quem vive junto dos pinhais já deve ter reparado que estamos em plena época de floração do pinheiro-bravo; aquela altura do ano em que uma fina poeira amarelada se espalha por todo o lado – são os incontáveis milhões de grãos de pólen libertados pelos estróbilos masculinos do pinheiro. Os estróbilos femininos, após a fecundação, darão origem às pinhas. Cumpre esclarecer que “estróbilo” é o termo que algum botânico desinspirado arranjou para designar o conjunto de flores unissexuadas das gimnospérmicas. Tratando-se de uma espécie monóica, o pinheiro-bravo possui, na mesma árvore, flores femininas e flores masculinas.

Claro que o poeta, para mais rei, ainda que soubesse desta terminologia científica, não estaria muito preocupado com minudências que lhe podiam estragar a cantiga – “flor” é uma palavra prenhe de poesia, enquanto “estróbilo” é um termo que pode desgraçar qualquer estrofe de amor. De gimnospérmicas e monóicas, é melhor nem falar… Lembremos antes as palavras do neo-trovador Afonso Lopes Vieira, natural da Leiria acastelada sobre extensos pinhais:

Ai flores do verde pinho

Dizei que novas sabedes

Da minha alma cujas sedes

M’a perderam no caminho.

 

Autor: Fernanda Lobo Gonçalves
DM

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19 março 2017