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Estamos no mundo para saborear o tempo. Mas gastamos grande parte da vida a numerar os anos. Não espanta, por conseguinte, que a numeração dos anos se sobreponha – quase sempre –à vivência do tempo.
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Para nós, até o tempo está sujeito ao número. Quando nos perguntam pelos anos, pelos dias ou pelas horas, respondemos com números. «Que horas são?» «Em que dia estamos?» «Em que ano nos encontramos?» A resposta a estas – e a outras perguntas – costuma ser debitada através de números.
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Cada fracção do tempo aparece-nos numerada. Desde o mais ínfimo milésimo de segundo até à agregação dos anos em séculos e milénios, as diversas unidades do tempo surgem-nos indexadas a números.
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Curiosamente, apenas os meses estão mais substantivados que numerados. Mas nem neste caso a terminologia escapa totalmente a uma matriz numeral. Basta notar que «Setembro» vem de «sete», «Outubro» de «oito», «Novembro» de «nove» e «Dezembro» de «dez».
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É por isso que nos sentimos desamparados quando não conseguimos associar uma determinada unidade temporal a um número. É o que sucede com a vida de Jesus. Quando queremos identificar um ano, os Evangelhos não costumam indicar números. Mas será que nos deixam sem resposta?
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É preciso não esquecer que, nos Evangelhos, o tempo é mais teológico que cronológico. Daí que tenhamos de ir mais além dos números sempre que nos voltamos para a vida de Jesus.
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Por exemplo, quando terá começado a Sua pregação? Há muitas respostas, por aproximação ou cálculo. Todas elas procuram numerar um ano. Há, entretanto, uma resposta – de teor mais teológico que cronológico – a que raramente prestamos atenção.
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Lucas, citando Isaías (cf. Is 61, 2), informa que Jesus começa o Seu ministério proclamando um «ano da graça do Senhor» (Lc 4, 19). Não espanta, aliás, que a designação dos anos chegasse a incorporar, além de um número, a expressão «Anno Domini» (Ano do Senhor) ou «Anno Domini Nostri Iesu Christi» (Ano de Nosso Senhor Jesus Cristo).
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O fundamental está no realce dado a Jesus Cristo.É Ele a graça que Deus nos faz, é Ele a graça que Deus nos envia.
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Os números já pouco importam. Importante é perceber que Jesus é o tempo último (cf. Heb 1, 2), o tempo pleno (cf. Gál 4, 4). É neste tempo que continuamos a viver (cf. Act 17, 28)!
Autor: Pe. João António Pinheiro Teixeira