A uma conhecida figura pública apontou António Damásio «uma enorme capacidade de ir ao “âmago” das coisas.
Eis o que nos falta, muitas vezes, mesmo a nós, cristãos: «ir ao “âmago” das coisas».
Por receio do compromisso e por presumir – equivocadamente – que o facilitismo agrega mais que a clareza, propendemos a vogar na órbita de quase tudo não chegando ao centro de quase nada.
E é assim que, numa altura em que tanto se fala da «inteligência artificial», também podemos estar a tracejar o perfil de uma indesejada «Igreja artificial».
Não tomo «artificial» no sentido daquilo que é produzido pela técnica, pelo engenho e pela arte.
Permito-me convocar o (des)qualificativo «artificial» no sentido daquilo que se afasta da sua natureza, daquilo que, portanto, não é autêntico.
Concretizando, a «inteligência artificial» – urdida pelo homem – quase dispensa o homem. Analogamente, a Igreja – gerada por Jesus – tornar-se-ia «artificial» se obscurecesse a centralidade de Jesus.
Ficaríamos com um mero «sistema eclesiástico», centrado em preocupações corporativas, em actos administrativos e numa linguagem hermética, repetitiva, sem coração e sem chama.
Contudo, esse perigo existe e qualquer um de nós pode soçobrar perante ele.
É o que acontece quando nos gastamos em iniciativas e discussões onde mal se adverte a «diferença cristã».
Estamos – e muito bem – a ser mobilizados a fazer um caminho em conjunto, que é uma oportunidade de ouro para refazermos a nossa consciência eclesial.
Mas este «caminho em conjunto» faz-se com quem? Obviamente com todos, incluindo Jesus.
À partida, parece uma atoarda ressalvar a (imperiosa) necessidade de incluir Jesus.
Só que, não raramente, corremos o risco de fazer d’Ele o grande ausente das nossas intervenções.
É claro que damos por suposto que Jesus é o centro vital de tudo.
Mas não basta dar por suposto. É urgente fazer transparecer Jesus nas palavras e nos silêncios, nas acções e nos gestos.
Viver em «Sínodo» é, acima de tudo, caminhar em conjunto «com» Jesus. Aliás, foi o convite que Ele mesmo fez aos primeiros discípulos: «Vinde coMigo» (Mc 1, 17).
Vamos, então, com Jesus. E, em Jesus, vamo-nos (saudavelmente) «infectar» com amor, paz, concórdia, bondade, fraternidade e reconciliação.
Jesus é sempre muito concreto, pelo que seguir Jesus não pode deixar de ser inteiramente tangível.
«Vamos com Jesus». E lancemos a todos a proposta de virem também ao encontro de Jesus. É na Sua companhia que o mundo será melhor. Em cada dia!
Autor: Pe. João António Pinheiro Teixeira