Ninguém pretende que a democracia seja perfeita ou sem defeito. Frequentemente é dito que a democracia é a pior forma de governo, salvo todas as demais formas que têm sido experimentadas. Numa democracia madura como a nossa, o povo votante tem essencialmente razão.
Quem não tem razão é o inscrito que se abstém, o maior perdedor é sempre aquele que deixa os outros decidirem o seu destino, pelo que, ao contrário do que os faltosos reivindicam, quando expressam a vitória porque os valores da abstenção são superiores à votação no partido ou coligação mais votada, a realidade é que quanto maior for a taxa da abstenção maior é a derrota dos que não votaram, embora também seja uma perda para o regime democrático.
Nas eleições autárquicas do domingo passado não foi diferente, houve surpresas, a maior das quais foi sem dúvida a conquista da Câmara Municipal de Lisboa por Carlos Moedas na coligação liderada pelo PSD. O atual presidente Medina é um homem forte de António Costa, visto como o sucessor da sua preferência e dispunha de todos os meios e visibilidade para renovar o mandato. Os próximos tempos e a reflexão que o próprio prometeu na noite eleitoral, dirão do seu futuro e ver-se-á se a vitória na capital dará um novo impulso a Rui Rio, sendo que, pelo menos para já, permite-lhe aguentar a liderança que estava manifestamente em perigo nestas autárquicas.
Ao contrário das anteriores, as eleições locais de 2021 não permitem uma leitura nacional clara. Em termos absolutos, o PS reclama vitória porque continua a ter o maior número de presidentes de câmara, mas perdendo para o PSD câmaras emblemáticas como as de Lisboa e Coimbra, o que permite a satisfação de Rio, acrescendo que teve um saldo positivo com o PS entre câmaras perdidas e ganhas.
A mudança da cor do partido em diferentes edilidades, é a demonstração inequívoca que o eleitor sabe o que quer. Sabido que é difícil a oposição vencer contra quem está no poder, a alteração da anterior liderança significa que a população não está satisfeita e ativamente quer um novo líder, diferentes projetos e novas aspirações para o seu município ou freguesia.
O distrito de Braga teve um comportamento de acordo com a normalidade. Houve duas trocas de partido, em Barcelos passou do PS para o PSD e o contrário ocorreu na Póvoa de Lanhoso. Fafe e Vila Nova de Famalicão mudaram de presidente de câmara, mas mantiveram as cores políticas. Celorico de Basto mantém o partido, mas agora sem maioria absoluta.
No concelho de Braga não houve grandes novidades nas eleições para a Câmara Municipal. Ricardo Rio mantém a maioria absoluta, mas com perda de um vereador a favor de Hugo Pires. As eleições de 2021 são mais comparáveis com as de 2013, onde os resultados foram parecidos e os vereadores foram identicamente distribuídos, pois em 2017, após o primeiro mandato, o desgaste natural do atual edil era inferior e o candidato atual do PS é politicamente mais forte e com mais apoios que Miguel Corais teve em 2017.
O discurso de Hugo Pires na noite de domingo ao prometer uma oposição construtiva, de olhos postos em ganhar a autarquia daqui a quatro anos, confirma que a sua grande aposta era numa candidatura à eleição seguinte. Manter o número de vereadores era catastrófico para o seu projeto, ganhar um e ter disputado com a CDU um quinto vereador possibilita-lhe a afirmação como líder da oposição e aspirar à luta pela vitória em 2025 onde já não enfrentará Ricardo Rio.
Não obstante a clara vitória, a redução da margem de votos relativamente às anteriores eleições – embora reconhecendo-se em diferentes contextos e que, em comparação com 2013, se a coligação Juntos Por Braga teve agora menos 3989 votos também é certo que o PS teve menos 2188 votos – é um aviso à estrutura local do PSD, que terá que delinear com brevidade a estratégia para as autárquicas 2025, onde já não poderá contar com a vantagem determinante de Ricardo Rio, sendo fundamental o rejuvenescimento e refrescamento das equipas, face à juventude e dinamismo que caracteriza Braga.
Do que se pode apurar, foi precisamente a força dos jovens que terá sido essencial para a vitória de Ricardo Silva na freguesia mais numerosa do concelho, mesmo sem apoio partidário. Surpresa o anúncio dos resultados da UF de Nogueira, Fraião e Lamaçães.
É a democracia em funcionamento. Mas como dizia Churchill, se os problemas da vitória são mais agradáveis que os da derrota, não são menos difíceis.
Autor: Carlos Vilas Boas