A televisão ligada hipnotiza os mais pequenos, um tablet ou um smartphone nas mãos de uma criança provocam demasiados estímulos, que interferem com a sua capacidade natural para descobrir o mundo, tornando-se responsáveis pela destruição da curiosidade infantil, uma das suas ferramentas mais poderosas, porque desrespeitam os ritmos normais de aprendizagem na infância.
As crianças nascem com faculdades inerentes, um desejo de conhecer e uma capacidade normal para se maravilharem com o que as rodeia, pelo que não é necessário nem prudente estimulá-las em demasia. Se o fazemos, “cancelamos” a curiosidade dos mais pequenos, que fica adormecida, a criança passa a depender de uma fonte externa de estímulos e deixa de querer conhecer e descobrir o mundo por si própria.
A perda da curiosidade dificulta a aprendizagem. A curiosidade é o desejo de conhecer e quando uma criança perde esse desejo é porque já viu tudo, já fez tudo, nada a surpreende e nada lhe desperta o interesse.
Catherine L’Ecuyer, canadiana a viver em Barcelona, autora do livro “Educar na Curiosidade”* editado pela Planeta, esteve recentemente em Portugal para o apresentar e salientou a importância de recuperar e simplificar a infância, bem como de ter em conta os ritmos de aprendizagem dos mais novos, alertando para o facto de a tecnologia actual e dos seus estímulos estarem na origem de crianças agitadas, que não se conseguem motivar e ficam cada vez mais impacientes.
A autora, mãe de quatro filhos, é consultora, investiga, escreve e dá conferências sobre temas educativos. Tem um MBA da IESE Business School e um mestrado europeu em investigação e defende que “é urgente reduzir o nível de stress e de consumo, porque andamos a dar demasiada importância ao conceito de competência digital, transformando as crianças em pequenos executivos stressados”.*
Referindo-se a crianças pequenas acrescenta que “elas não têm força para conseguir controlar o consumo da tecnologia que é muito potente. A melhor preparação para o mundo digital é o mundo real. O argumento de que é preciso antecipar a introdução das novas tecnologias para um uso mais responsável não é válido, porque a criança não está preparada para isso. O uso responsável não se consegue dando tecnologia a uma criança pequena”. “A infância é a idade dos jogos, da imaginação, uma idade em que se aprende muito. É importante vivê-la no momento certo, caso isso não aconteça, as pessoas terão de a viver depois, por isso hoje há tantos casos de infantilismo, que é a falta de maturidade nos adultos”.*
“Cada vez mais as crianças se comportam como pequenos adultos, mas é importante deixar que as crianças sejam crianças. Quando adiantamos etapas fazemos com que a criança faça e veja tudo antes do tempo e como não está preparada para assimilar esse conteúdo ou essa informação acaba por gerar problemas no seu desenvolvimento”.*
“Brincar, que é muito mais activo, não é o mesmo que entreter-se, que é passivo. Na brincadeira a motivação é interna, a criança actua a partir de dentro. Na diversão a motivação é externa, não é activa e a criança não tem curiosidade, fica fascinada mas não é a mesma coisa. No primeiro caso a criança presta atenção, no segundo está desatenta.”*
Se é importante que a criança descubra o mundo ao seu ritmo quando ainda não há educação formal, também é indispensável haver regras e normas, porque não são coisas incompatíveis. O importante é que se ensine a criança a desejar aprender e não a deixar fazer tudo o que quer.
Urge proporcionar-se às crianças um ambiente adequado real num mundo que tem limites e não permitir que naveguem num espaço virtual que é um puro engano de ilusões e está cheio de impensáveis riscos, quando não é feito um controle com acompanhamento dos pais.
*in “Educar na Curiosidade”
Autor: Maria Susana Mexia