De todos eles já falámos, assim como de Efialtes: a meados do século V a. C., assume relevo preponderante a sua acção que havia de destronar os privilégios aristocráticos exercidos através do Areópago, ousadia paga com tributo demasiadamente alto, a sua própria vida: um avanço para uma sociedade mais inclusiva e democrática, escrito a letras de sangue.
Por último, este caminho para igualdade entre os cidadãos no exercício pleno dos seus direitos políticos seria alcançado com Péricles, como também já vimos, ao instituir uma espécie de vencimento (mistoforia) que ajudava a minorar as dificuldades dos cidadãos mais pobres, oriundos geralmente das zonas rurais mais afastadas. Sob o consulado deste célebre estadista ateniense se viria a consolidar o regime democrático, a organização política com maior fortuna até aos dias de hoje, enquanto marca distintiva da forma de viver do mundo ocidental.
A sua liderança foi de tal modo influente nesta época, sobretudo a partir da sua eleição em 454 a. C. para o cargo de estratego principal, que este período de tempo havia de ficar conhecido pela designação de «Século de Péricles». É bom recordar que estes são anos de ouro que transformam Atenas na «Escola da Hélade», como este a costumava designar: o teatro (a tragédia, com Sófocles), o pensamento filosófico (Sócrates) e a expressão artística (a famosa Acrópole de Atenas) atingiriam cumes de desenvolvimento e perfeição inigualáveis até então e que ainda hoje continuam a inspirar o Ocidente humanista!
Desta forma, o regime democrático havia de conduzir a florescente Atenas a um lugar ímpar na Antiguidade! De tal forma que ela é a principal fonte documental para o estudo da Democracia.
No início destas nossas reflexões, há um ano e meio, comentámos que este percurso, a busca da democracia, foi impulsionado pela necessidade de se encontrar uma solução para a crescente conflitualidade social, que opunha os ricos aos pobres, a aristocracia ou os nobres ao povo. E para dar voz a esse ideal foi cunhada uma nova palavra que, pela primeira vez, reconhecia a supremacia dos mais pobres, do povo, pois são em maior número: democracia.
Esta palavra é constituída por dois termos gregos, «dêmo-», povo, e «krat-» (de kratos), poder, soberania; daí que, democracia, etimologicamente, tenha o significado de «governo pelo dêmos», isto é, pelo povo. Um conceito que Aristóteles regista no seu tratado da Política: «chamamos democracia ao regime em que os mais pobres, sendo muitos em número, estão no poder».
E quem é este povo? «São os pobres, dentre os cidadãos», diz Eutidemo a Sócrates, conforme registo de Xenofonte nos Memoráveis (4.2.36-37). E logo esclarece o que entende por pessoas ricas e pobres: «os pobres, penso eu, são os que não possuem o suficiente para pagarem aquilo de que necessitam, enquanto os ricos têm mais do que o suficiente».
Autor: António Maria Martins de Melo