Na edição do Público do passado Sábado foi dado amplo destaque ao conteúdo do relatório recentemente apresentado ao Governo pelo Conselho de Revisão do Conceito Estratégico de Defesa Nacional, para servir de base às Grandes Opções a discutir na Assembleia da República.
Para além de uma interessante entrevista a Nuno Severiano Teixeira que presidiu àquele Conselho, conduzida pela jornalista Teresa de Sousa, o jornal contém uma notícia sobre o documento em análise, da autoria da mesma jornalista, onde basicamente se explica a revisão do último Conceito Estratégico de Defesa Nacional (CEDN), de 2013, a grande novidade da inclusão pela primeira vez do tema da “estabilidade financeira” como prioridade nacional de segurança, as prioridades europeias da “coesão da NATO”, do reforço da “autonomia estratégica” e do desenvolvimento de uma “Política Comum de Segurança e Defesa” e as prioridades portuguesas gerais e específicas, entre as quais as decorrentes da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP) e da importância de uma diáspora “dispersa pelos cinco continentes”.
Não me proponho comentar aqui a pertinência e importância da revisão ora proposta no relatório em apreço que, globalmente, se me afigura perfeitamente justificada face ao novo ambiente internacional, regional e nacional e às ameaças que comporta – guerra na Ucrânia, competição entre as grandes potências (China, EUA e Rússia), alterações climáticas, pandemias e ciberguerra, etc. –. De resto, tal revisão apresentar-se-á em linha com o Novo Conceito Estratégico e com a Bússola Estratégica que a NATO e a EU, respectivamente, adoptaram em meados do ano passado, e com a relação de complementaridade que se reconhece ter de ser aprofundada entre ambas as organizações.
O meu reparo versa tão só sobre uma omissão que me parece inaceitável: a da defesa e promoção da língua e cultura portuguesas.
Efectivamente, se é verdade que as comunidades portuguesas espalhadas pelo mundo têm de ser consideradas um importantíssimo património nacional e um fortíssimo trunfo para a afirmação de Portugal no concerto das nações – e daí a justeza do reconhecimento, no relatório em análise, do carácter estratégico do reforço da ligação do país à nossa diáspora –, não é menos certo que a língua pátria constitui um património inestimável que urge preservar, cultivar e divulgar com toda a alma e convicção, pois nela residem, em última instância, a essência e a independência da nação que somos e a nossa liberdade individual.
Aliás, para além de veículo de ligação à diáspora, não pode obliterar-se que, embora limitado no presente ao território europeu, Portugal é, ainda hoje, matriz de um vasto império linguístico que abarca cerca de 280 milhões de falantes (quinta língua mais falada no mundo e a terceira mais falada no hemisfério ocidental). Como também não pode esquecer-se – e o dito relatório enfatiza-o – que a CPLP tem de ser encarada “…como um quadro prioritário para a projecção dos interesses nacionais”.
Acresce que, perante a actual crise do Estado soberano, traduzida, ao nível externo, na perda da sua capacidade reguladora face a entidades supranacionais, a favor de quem vão sendo delegadas parcelas importantes de soberania e, ao nível interno, pela defesa de figurinos institucionais e orgânicos mais descentralizados, percebe-se a razão por que a defesa da nossa língua tem de constituir um interesse vital e permanente de Portugal.
Mas, para além da afirmação estratégica do nosso país na Europa e no mundo, o ensino e domínio da língua materna é condição da plena afirmação intelectual dos seus cidadãos, como da sua liberdade e da sua inclusão social, política e económica, constituindo também um pilar fundamental do desenvolvimento da nação.
Eis porque, caros leitores, advogo ser prioritário incluir na revisão que se prepara do CEDN a defesa e promoção da língua e cultura portuguesas.
Autor: António Brochado Pedras