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Caranguejos portugueses

Intrigado com o comportamento dos caranguejos que vão sendo introduzidos no balde, pergunta ao pescador: 

– Como é possível não lhe fugir nenhum caranguejo se o senhor sempre que se volta para apanhar novos caranguejos vira costas ao balde que nem sequer tapado está? 

E o pescador muito convicto e sereno responde-lhe: 

– Sabe, meu senhor, estes são caranguejos portugueses e, então, sempre que ali algum deles tenta trepar pelo balde acima, os outros juntam-se e, de imediato, deitam-no abaixo. 

Pois bem, esta anedota carateriza, na perfeição, o comportamento lusitano, sobretudo em situações gregárias, quando estão em causa, por exemplo, a subida de cargo numa empresa, a conquista de um privilégio num qualquer estabelecimento comercial, enfim, a luta por um lugar ao sol; e numa clara demonstração de nivelamento e igualdade posicional ou, mais evidente ainda, na denúncia e condenação de qualquer ação bajulativa. 

Na prática, por razões de idiossincrasia ou tática ocupacional, caranguejos portugueses que não trepam, nem deixam trepar há-os, por aí, aos cardumes: nas repartições públicas, privadas ou semiprivadas, nos estabelecimentos comerciais e industriais, nas escolas, nos hospitais, etc. etc. etc.; e, então, nos partidos políticos eles são mesmo uma praga bem pior que qualquer das sete pragas do Egito.

Todavia, como substitutos da difícil e inglória ação trepadora dos caranguejos portugueses, surgem os caranguejos minhocões, viscosos, insidiosos e besuntões, cujo objetivo passa por agradar ao chefe e, assim, tentarem a promoção ou a segurança no emprego, tão rara nos tempos que correm. 

E a coisa funciona nestes moldes: o funcionário ou funcionária (aqui, as armas femininas mais poderosas são) de uma determinada organização começa por dar nas vistas, evidenciando-se, aproximando-se solícito e disponível, exagera nas cortesias e vénias; mas, os caranguejos que não trepam, nem querem que os outros trepem, perante a evidência ativa do colega, armam-lhe o cerco, criticam-lhe as intenções e modos, puxam-no para baixo, denunciando e motejando as suas artimanhas e motivações. 

A estes caranguejos, claramente mais rastejantes do que trepadores, se chama lambe-botas e nunca deixaram de existir, desde que o mundo é mundo e os homens abandonaram os guinchos e os saltos de galho em galho quais chimpanzés das florestas. 

Ora, os lambe-botas pertencem à espécie zoológica dos invertebrados que são animais desprovidos de endosqueleto desenvolvido e de crânio propriamente dito; e porque se deslocam arrastando-se, preferem os ambientes lodosos, húmidos, lamacentos. 

A sua principal caraterística profissional e sociológica é a bajulação e a adulação o que executam com elevadas doses de salamaleques e verborreia fácil; e, hoje em dia, proliferam em abundância nos ambientes político-partidários como cogumelos em monturo; e, uma vez instalados, depressa passam a ocupar lugares de topo, mando e chefia em tais organizações, não fosse a política partidária que temos a arte de bem falar, bem fingir e melhor trampolinar. 

E porque, quase sempre desprovidos de massa cinzenta que baste e de qualidades profissionais e éticas que se prezem, os lambe-botas espalham incompetência, ineficiência, desonestidade e opacidade até dar com um pau; e o que mais tarde ou mais cedo, digo até, mais cedo do que tarde, acabam por colaborar ativa mas negativamente na imagem das organizações partidárias que servem e do país a que pertencem; e, mormente, na governação cabal do mesmo país. 

Quem andar minimamente atento dificuldade não tem de comprovar, no nosso dia a dia, isso mesmo e muito mais. 

O que nos leva a praguejar: 

– Porra, vai cá uma nortada! 

Então, até de hoje a oito.

 

Autor: Dinis Salgado
DM

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26 abril 2017