Nos meus tempos de estudante, tão longínquos, quão saudosos, Braga não passava de uma cidade provinciana, fechada, doméstica e, sobretudo, bisbilhoteira; e isto se traduzia naturalmente no modo de ser e estar das suas gentes que, mesmo residentes em S. Vítor, Maximinos ou S. Vicente, quando, aos Domingos, se propunham dar uma volta caseira, diziam: vamos até à cidade.
Então, no que à vida noturna concernia, era vê-la pelo tal canudo, pois deitava-se com as galinhas e levantava-se com os galos; e, assim, antes da meia-noite, mais coisa menos coisa, o silêncio, a soturnidade e os morcegos caiam sobre a cidade, fechando restaurantes, cafés, tascas e cinemas e fazendo com que os notívagos se convertessem numa espécie rara a que um ou outro polícia de giro e, sobretudo, os guardas-noturnos não achavam piada nenhuma e, depressa os mandavam para penates.
Hoje, relatar esta estranha forma de vida à nossa juventude é correr o sério risco de ser apodado de antiquado, cotas ou bota-de-elástico; e se pensarmos que já na década de 60 Lisboa tinha uma vida noturna intensa, estuante e boémia (andava quase tanta gente de noite na rua como de dia) que a nós, ingénuos provincianos que por lá passávamos, estupefactos nos deixava, depressa concluímos que Braga levou várias décadas a dar o salto de gigante e se lançou na rota de cidade com vida noturna e, até, notívaga.
Todavia, sendo uma cidade muito jovem e académica, as mudanças acontecem a um ritmo veloz e constante, transformando-a, ao mesmo tempo, numa urbe empreendedora cosmopolita, moderna e inclusiva, onde o poder local na sua ação dinâmica, briosa e educativa tem um papel decisivo na promoção e desenvolvimento cultural e cívico das suas gentes; e a este impulso qualitativo de modernidade e cosmopolitismo não é estranha a vida noturna que por aí fervilha.
Mas, como não há bela sem senão, esta nova realidade da nossa cidade acarreta constrangimentos vários que é preciso ter em conta e contornar; essencialmente os que chocam com a segurança, bem-estar e sossego dos bracarenses que são afetados diretamente pelos efeitos negativos dessa vida noturna, bem como pela ausência de respeito e preservação do património público e privado. A este propósito, lamentava-se, há dias, na imprensa diária, local e nacional, o cónego José Paulo Abreu contra o vandalismo noturno que, no centro da cidade, ameaça o património histórico; e concretamente apontava os casos da Torre Medieval, no Largo de S. Paulo, onde o arremesso de uma garrafa de cerveja partiu um vidro da sua estrutura de segurança, causando um prejuízo de milhares de euros e da escadaria de acesso à entrada do Museu Pio XII, onde a sujidade é imensa (garrafas, papéis, pensos higiénicos, copos espalhados) e o cheiro nauseabundo invade a zona.
Ora, todos sabemos que estes atos de mau civismo há muito se sucedem um pouco por toda a cidade, sobretudo aos fins-de-semana, quando a concentração de notívagos mais se acentua, bebendo e divertindo-se sem regras nem propósitos; e sempre o fazendo sem o mínimo respeito pelo descanso dos moradores dessas zonas e pelos bens públicos e privados. Pois bem, a preocupação das entidades governativas da cidade em atrair residentes para o centro histórico, muito despovoado e abandonado e onde estes atos mais acontecem, é uma medida a aplaudir; ademais uma cidade viva, educadora e inclusiva é uma cidade próspera e de futuro que não deve afastar a população, como aconteceu anteriormente, do centro para as periferias pelas dificuldades que lhe causou de movimentação e acesso automóvel às suas residências e na procura de bens e serviços, bem como consentindo na degradação e desatualização das suas residências; todavia, com a invasão atual do centro histórico pelo desassossego, vandalismo e insegurança noturnos, mais difícil se torna atrair moradores a tais zonas.
Por isso, é necessário e urgente legislar com ponderação e firmeza sobre a utilização destes locais no centro da cidade no que à sua vida noturna diz respeito, tendo em conta primeiramente os interesses de quem neles habita e, só depois, os dos promotores, ativadores e utilizadores da vida noturna; e, de seguida, se ative um policiamento de proximidade, atuante e desmobilizador, que garanta a tranquilidade e segurança de pessoas e bens e imponha o dever de urbanidade e civismo.
Até para que finalmente possamos declarar que
– É BOM VIVER EM BRAGA!
Então até de hoje a oito.
Autor: Dinis Salgado
Braga notívaga
DM
13 dezembro 2017