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À mesa do café

E o diálogo estala, em jeito de conversa, à mesa do café: – E, então, como vai este país? – Este país vai bem. Há paz nas ruas, nas estradas nem por isso; e o povo pelo que consome parece que vive muito bem, só que, se não se pensar frenar a compra de carros, em breve são mais os carros do que as varejeiras por aí a zunir. – Pois é, até se pede empréstimo aos bancos para passar férias e comprar roupa de marca; e o governo geringonçado lá vai governando e varrendo para debaixo do tapete as medidas desagradáveis, enquanto o ministro das finanças garante que o défice ainda vai baixar mais do que o previsto, só que, como diz o povo, quanto mais se agacha mais o dito coiso se lhe vê. – Só que, enquanto o povo dorme, o governo sobe impostos, faz cativações, mantém a austeridade e emprega os familiares na máquina do Estado, os banqueiros afundam os bancos, os hospitais, escolas, esquadras de polícia, quartéis e tribunais colapsam e, enquanto o barco se afunda, a mesma sinfonia governativa se faz ouvir: blá - blá - blá. E eu acrescento: pois quando cheira a eleições por perto, na boca dos candidatos a um lugarzinho nas listas, já não há nuvens negras no horizonte; e ao preço a que tais tachos estão... Também é preciso mentir ao povo, vender-lhe gato por lebre, pois uma peta bem metida em época eleitoral vale por muitas verdades ocultadas, fazendo-lhe promessas, muitas promessas que não custam dinheiro e quase sempre são para não cumprir; e garantindo-lhe, para um futuro muito breve, um país cor de rosa que é a cor da esperança, da fartura e da felicidade e para que não lhe fuja com o tal papelinho milagroso nas umas. Só a título de exemplo: acaso alguém se lembra de promessas eleitorais não cumpridas pelo atual governo? Ai, não? Ora, então, aí vai uma ou duas pelo menos: onde está que a não vejo a melhor saúde para os portugueses, sobretudo acabando com as listas de espera para uma cirurgia ou consulta que se prolongam por meses e, até, anos; ou onde está a habitação para todos e a preços comportáveis? Pois é, o povo para a maioria dos políticos não passa de uma besta-quadrada e só vale enquanto tem na mão o tal papelinho mágico que garante influência, mordomias, emprego, poder; e, logo que lho apanham, ficam duros de ouvido e palpitantes do coração; salve-se, ao menos, a circunstância de nenhum desses políticos se lembrar de caçar votos à espingarda. Sem dúvida que o poder cega e de tal jeito que certos governantes ficam incapazes de reconhecer como o rei da história, quando vão nus à vista de todo o reino; e tamanha lata eles têm que, mesmo não cumprindo as promessas eleitorais que fizeram para garimpar a boa-fé do povo, candidatam-se e recandidatam-se com tamanha latosa e como se nada fosse. Eles jogam, claramente, na certeza de que a memória do povo é curta e extremamente débil e maleável; e, por isso, sempre fácil é dar-lhe um bom rebuçado à última hora para esquecer os amargos de boca e as dores de coração anteriores; tal e qual como se o povo fosse o cão de Pavlov, cujos reflexos políticos se condicionassem com torrões de açúcar ou molhos de boas intenções. Não sei se algum dia o povo vai deixar de se enrolar por tanto vendedor de banha de cobra; mas o que sei, indubitavelmente, é que, à sua custa, se tem por aí instalado e perpetuado muita incompetência, corrupção, clientelismo e amiguismo; e, mais grave ainda, a prática da endogamia política que é a dominação da máquina do Estado por familiares diretos e indiretos contratados, como aconteceu ultimamente com o atual governo de António Costa. E esta é a triste realidade de que, desde que o povo é povo, ele sempre tem as costas largas para tudo, até para ser incansavelmente o bombo da festa de quem governa; e, mais triste ainda, é que tarda a surgir o verdadeiro estadista que, respeitando a sua identidade, idiossincrasia e verdade, governe com ele e para ele. Entretanto só temos que praguejar: – Porra, vai cá uma nortada! Então até de hoje a oito.
Autor: Dinis Salgado
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17 abril 2019