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A lição de vida dos 3 Reis Magos

Sempre gostei da narrativa dos 3 Reis Magos, que vem referida no evangelho de Mateus, 2:1-12. E tive pena que esta comemoração fosse riscada dos dias feriados na quadra do Natal, porque ela já fazia parte do nosso imaginário cultural e religioso. “Cantar os reis” aos amigos e expressar votos de um Novo Ano Feliz era um hábito popular que aproximava festivamente as pessoas e se difundiu por toda a parte. Pena foi que esta tradição se fosse perdendo devido ao tipo de habitação coletiva das vilas e cidades. Para além de expressão de convívio amigável, a festa dos 3 Reis Magos trazia implícita a necessidade de estar atento aos sinais dos tempos e a fidelidade às suas mensagens, mesmo que para isso se tivesse de mudar a nossa vida, como foi o caso. Por exemplo, que diriam hoje e que fariam os 3 Reis Magos perante o apelo do Papa Francisco em relação à renovação da Igreja, a que chamou sinodalidade, perante a crise de abandono e desinteresse que cresce dia a dia?

A narrativa dos 3 Reis Magos é simples, mas abrange toda a vida e cheia de conteúdo pessoal e maravilhoso, familiar, social, político… É muito mais do que turismo religioso. Nela se destaca, pela negativa, a figura política maquiavélica e cruel de Herodes, o Grande e a sua astúcia para tirar proveito próprio dos acontecimentos, sem olhar a meios, figura que em política ainda hoje persiste, que todos detestam, mas que continuam a votar neles.

Que estrela era essa? A narrativa evangélica diz apenas que os magos descobriram no céu uma estrela especial, que chamou a sua atenção e à qual eles atribuíram significado especial, ligado a uma história pessoal.… (as coisas só são importantes quando lhe reconhecemos significado no nosso coração). E resolveram seguir o seu rumo, levando, por isso, presentes para lhe oferecer. O imprevisto levou-os a ir ter com a pessoa errada, Herodes, que era governador da Judeia e a perguntarem-lhe onde tinha nascido o rei dos Judeus, pois queriam visitá-lo e prestar-lhe homenagem. À maneira clássica do político profissional, Herodes ficou em pânico, com medo de perder o seu cargo e o seu poder, mas disfarçou bem e fugiu à questão incómoda, dizendo que não sabia de nada… mas que também ele queria associar-se a essa homenagem. Sendo assim, pediu-lhes que, no regresso, voltassem a passar por lá para o informar, embora o que ele queria era mandá-lo matar, eliminando o mal pela raiz. É uma cena que continua actual: a boa-fé do povo (aqui representada pelos 3 Reis Magos, na sua sinceridade) e o egoísmo político para quem o que interessa é o interesse do povo desde que coincida com o seu próprio interesse.

Ultrapassado esse imprevisto do encontro com Herodes, os 3 Reis Magos voltaram a descobrir a estrela especial e continuaram a segui-la, que os conduziu até Belém, onde encontraram o menino e seus pais, o adoraram e lhe ofereceram os presentes que traziam:

-ouro (que representa a realeza, um presente que se oferece aos reis);

-incenso (que representa a fé e simboliza as orações que sobem até Deus: ver Salmo 141:2);

-mirra (resina antisséptica, também usada no embalsamamento no Egipto, que simboliza a imortalidade: sabe-se que o corpo de Jesus, antes de ser sepultado, foi ungido com mirra e aloés- João 19:39-40).

2. Quem eram estes 3 Reis Magos? Há quem admita que seriam sacerdotes astrónomos da religião zoroástrica, da Pérsia (na época, ainda não se distinguia a Astronomia como ciência da arte divinatória da Astrologia). Também não se sabe porque lhe chamaram reis. No evangelho de Mateus são chamados magos, homens sábios que estudam as estrelas. A designação de reis só aparece mais tarde, pelos finais da Idade Antiga e princípios da Idade Média, possivelmente porque associaram este acontecimento a uma profecia bíblica que dizia que reis de toda a Terra (Salmo 72:11) viriam adorar o Messias que iria nascer e lhe haviam de trazer presentes e se ajoelhariam diante dele.

3. De onde vieram? O evangelho de Mateus também não especifica. Diz apenas que vieram do Oriente, de regiões a leste da Palestina. O Venerável Beda escreveu, por volta do ano 500, que Belchior (também dito Melchior) terá vindo das terras de Ur, terra dos Caldeus; Gaspar terá vindo das terras do Mar Cáspio e Baltazar terá vindo das proximidades do Golfo Pérsico. Em conclusão, terão vindo da Babilónia, da Pérsia e da Arábia. Também não se sabe documentalmente quantos reis eram. O que ficou para a História foi que eram 3.

4. O que é que lhes aconteceu depois também não se sabe. Uma lenda diz que, depois da morte de Jesus, teriam sido encontrados pelo Apóstolo Tomé, no reino de Sabá, onde foram baptizados e, mais tarde, nomeados líderes de comunidades de convertidos ao cristianismo, tendo depois sido martirizados por causa da sua fé. Diz-se que os seus restos mortais foram encontrados por Santa Helena, mãe do imperador romano Constantino, que os trouxe para Constantinópola. Daí, terão sido levados para Milão. E, em 1164, levados pelo imperador Frederico Barba Roxa para Colónia, na Alemanha. Como havia muitas peregrinações para os venerar, aí foi construída uma grandiosa catedral gótica, onde repousam os seus restos mortais, guardados num relicário de ouro, colocado por detrás do altar. A devoção aos 3 Reis Magos teria começado sobretudo na Idade Média. Ainda hoje a Igreja Ortodoxa comemora a adoração dos 3 Reis Magos no dia de Natal.


Autor: M. Ribeiro Fernandes
DM

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16 janeiro 2022