Sem perdermos de vista que estamos focados na segunda metade do século V a. C., a época por excelência da democracia em Atenas, as fontes históricas, quando falam da população desta cidade, identificam três categorias de pessoas: cidadãos, metecos (estrangeiros que se dedicavam ao artesanato e comércio) e escravos.
Segundo Ribeiro Ferreira, não se pode falar propriamente em classes sociais, pois estas interagiam entre si, isto é, «os elementos podiam passar de uma a outra» posição, no sentido ascensional, havendo também a possibilidade do inverso, como se pode ler no seu manual universitário A Democracia na Grécia Antiga.
Descendo a números, as fontes apontam para cerca de dez por cento de cidadãos, isto é, numa população de cerca de trezentas mil pessoas, apenas trinta mil eram cidadãos, os únicos que possuíam direitos políticos. A esta luz se devem compreender as vozes de Platão e Aristóteles, quando fixam como número ideal de cidadãos de uma pólis, respectivamente, «cinco mil e quarenta proprietários» (Leis, 737c) ou um conjunto dentro de certos limites, quando discorre acerca da Amizade: «quanto aos bons amigos, será preferível ter o maior número possível, ou convém guardar uma certa medida na quantidade, como acontece com o de cidadãos na polis? É que nem dez homens constituem uma pólis, nem com cem mil existe já pólis. A medida, no entanto, não é por certo um número determinado, mas um conjunto dentro de certos limites» (Ética a Nicómaco, 1170b 29-35).
Destas afirmações decorre uma conclusão, que colide abertamente com a actualidade: a democracia ateniense não é de natureza representativa, mas directa e plebiscitária. O reduzido número de pessoas com direitos políticos a isso conduzia, pois permitia a participação da sua totalidade em todas as questões que eram objecto de deliberação na Assembleia, onde todos os cidadãos tinham assento, como iremos ver.
Por outro lado, esta especificidade conduziu alguns críticos modernos a apelidar o regime democrático ateniense de «aristocracia alargada», um eco das críticas que já vêm desde a Antiguidade, como se pode ler na biografia de Péricles redigida pelo historiador grego Plutarco (9.1): «Enquanto Tucídides descreve o governo de Péricles como aristocrático – sob o nome de democracia, “na prática era o primeiro dos cidadãos quem governava”.
E o biógrafo remata o parágrafo, dando conta de outras críticas, comuns aos tempos actuais, não faltando mesmo a referência ao problema da emigração, como solução temporária para os problemas de pobreza e de excesso de população na cidade de Atenas: «muitos outros dizem que pela primeira vez o povo foi induzido por ele às cleruquias, aos subsídios para assistir ao teatro e à distribuição de compensações pelos serviços públicos; foi por causa das medidas de então que se habituou mal e se tornou esbanjador e libertino, em lugar de ser prudente e trabalhador. Observemos, em função destas acções, a causa da mudança de política».
Autor: António Maria Martins Melo