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A Bíblia nos laboratórios da Ciência

O último fascículo da revistaScience & Vie(nº 1205 / fevereiro de 2018)integra um dossiê intitulado “Revelações sobre a Bíblia”, título bastante sugestivo mas não menos equívoco.

Mais importante do que a discussão sobre a exatidão do título é a natureza do seu conteúdo: informa-nos das mais recentes investigações realizadas por um grupo de ciências sobre diversos aspetos da narrativa bíblica, como também sobre o próprio manuscrito.

Nada de novo, portanto, quanto ao interesse que a Bíblia desencadeia nos homens de ciência. A arqueologia bíblica desempenhou (e ainda desempenha) um lugar de destaque na procura de respostas “científicas” para muitas questões levantadas pelos Livros Sagrados.

Porém, a investigação de ponta, desenvolvida sobretudo a partir da década de 80 do século XX, dispõe de novos instrumentos tecnológico-científicos que permitem alcançar conhecimentos bem mais precisos e objetivos, contribuindo assim para o esclarecimento de muitos dos elementos contextuais da narrativa das Escrituras, como de muitos dos aspetos do seu conteúdo.

A este nível, o fascículo da revista referida mostra-nos, entre outras matérias, comoa genómica encontra o vestígio de Abraão; como a geofísica nos elucida sobre as dez pragas do Egipto; comoa astronomia consegue datar o triunfo de Josué; como afilogenética desvela a origem do mito do Dilúvio; comoa ciência dos “big data” reconstituem os textos originais; comoa microtomografia liga os fios da história; enfim, comoa arqueometria distingue os verdadeiros manuscritos dos falsos.

Perguntar-se-á: é fundamental para o crente conhecer estas (e outras) descobertas científicas realizadas bem no miolo do Texto Sagrado? Julgo que não é fundamental, pois a Bíblia é um Livro de fé e não de ciência, é um código de manifestação de sentido, uma hermenêutica da vida e da existência na sua relação com o Absoluto. E por isso, é algo que está noutro patamar, aquém e além da ciência e das suas descobertas, também estas sempre fragmentárias e provisórias.

Mas, se não é decisivo para a vivência da fé, é muito importante para a qualidade de uma fé mais esclarecida. Por maioria de razão, e porque a razão deve dialogar com a fé, os conhecimentos de tais aportações da ciência são absolutamente requeridos quando os problemas são discutidos e apresentados a nível mais exigente, ou quando se pretenda um fim formativo e pedagógico, junto de auditórios específicos, como por exemplo, perante os alunos na Escola ou perante os crentes na Igreja.

Certamente, as disciplinas que refletem sobre o fenómeno religioso, entre as quais a Filosofia da Religião, não poderão ignorar tais contributos, mesmo que seja para demonstrar que o essencial da religião não está neles.Daí, também, a necessidade, para todos os que trabalham a este nível, de uma formação permanente, que acompanhe o desenvolvimento da ciência, o posicionamento da religião e a argumentação filosófica, a quem compete a tarefa de uma articulação dialética.


Autor: Carlos Bizarro Morais
DM

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4 março 2018