É dolorosa a enfermidade. Mas mais dramático é não nos apercebermos dela. Vogamos em crise pelo tempo. Sabemo-lo, mas seremos capazes de a identificar?
A crise atual da religião – observa Byung-Chul Han – encontra-se sobretudo «no declínio da atenção».
Desatentos, proclamamos desde Nietzsche que «Deus morreu». Mas quem estará morto – como reparou o ensaísta sul-coreano – não será o homem «a quem Deus Se revelou»?
Sem atenção, como dar conta do que acontece, do que passa e do que não passa? Sem atenção como centrar a nossa vida no eterno se nem sequer entendemos devidamente o efémero?
A atenção requer silêncio e escuta. Só que, refratários ao silêncio e indisponíveis para a escuta, guiamo-nos pelos estímulos que nos chegam deste vendaval de ruído que nos cerca.
E é assim que, em vez da atenção, somos conduzidos pela perceção. Só que, ao contrário da atenção, a perceção é muito condicionada. Dificilmente é capaz de nos mostrar a realidade, inundando-nos apenas de «retratos» muito instantâneos e pouco consistentes.
A perceção – anota Byung-Chul Han – «é cada vez mais controlada por estímulos e vícios». Só nos deixa consumir; não nos permite ver.
A perceção «quase fica empanturrada com lixo informativo e comunicativo, com lixo sonoro e visual».
A atual «crise de atenção tem que ver com o facto de só querermos comer, consumir, em vez de olhar».
A perceção dispensa a atenção. «Ela devora tudo o que se lhe apresenta. Esquecemos que a atenção contemplativa é essencial para ver.
Os próprios cristãos correm o risco de agir mais em função de perceções fornecidas por impulsos repentinos do que em razão da atenção recetiva, serena e lúcida.
São essas perceções que nos instigam a apostar em atividades movimentadas, em eventos ruidosos, em prioridades discutíveis. Fazendo o que todos fazem, seremos capazes de ajudar a ver Aquele que é suposto encontrar na Igreja?
Estar na Igreja pressupõe uma atenção ao que nos escapa habitualmente. Será que o conseguimos?
As perceções fragmentam a atenção, repartindo-a em simultâneo por uma infinitude de estímulos.
É por isso que, hoje em dia, estamos constantemente distraídos.
«Saltamos de uma informação para outra, de um estímulo para outro». Abandonámos Deus devido à nossa distração constante.
Nem no Advento estamos atentos.
Os estímulos embriagantes do consumo distraem-nos da atenção devida ao mistério de Deus que Se faz homem e homem manso e humilde.
Sucede que o consumo tem uma duração muito curta e um efeito que acaba por se tornar entediante.
Só a atenção pura – à maneira de Maria, de José, dos pastores e dos magos – nos dirige para Deus!