Costumamos falar do luto como uma dor da alma ou do coração. Mas quem o vive sabe que ele também se inscreve no corpo. A perda não se sente apenas em pensamentos e emoções – manifesta-se na pele, nos músculos, na respiração, no sono. O corpo fala quando as palavras falham. Muitas pessoas relatam insónias, perda ou aumento de apetite, dores no peito, fadiga intensa, tensão muscular. Outras sentem o corpo pesado, como se cada gesto exigisse uma energia que já não está disponível. Estes sinais não significam fraqueza: são a forma que o corpo encontra para expressar aquilo que a alma ainda não consegue nomear.
Na nossa cultura, ainda falamos pouco sobre o impacto físico da dor. É como se o luto fosse apenas uma experiência emocional ou espiritual. No entanto, o corpo denuncia aquilo que muitas vezes preferimos calar. Espera-se que alguém em luto “esteja melhor” ao fim de alguns dias ou semanas, mas o corpo continua a carregar o peso da ausência. Essa pressão para sorrir de novo, para “voltar ao normal”, contrasta com a linguagem silenciosa do corpo, que insiste em dizer: “Ainda dói.” Reconhecer esta dimensão é também um ato de compaixão — para consigo e para com o outro.
As emoções e o corpo estão profundamente ligados. A tristeza pode trazer aperto no peito, a ansiedade acelera o coração, o medo contrai os músculos, a raiva tensiona os maxilares. Estes sintomas não são sinais de doença, mas expressão natural da dor. O corpo torna-se um espelho da alma ferida. Mostra, através de sinais físicos, a intensidade do amor e da perda. Ao mesmo tempo, lança um apelo: precisa de cuidado, de presença, de reconhecimento.
No luto, pequenos gestos de cuidado corporal podem ser bússolas de orientação, pois cuidar do corpo é também cuidar da alma:
Respeitar o descanso – Não exigir produtividade imediata, aceitar que o corpo precisa de mais tempo.
Caminhar ao ar livre – O movimento simples pode ajudar a libertar tensões e dar leveza.
Respirar de forma consciente – A respiração profunda é uma âncora para quem sente ansiedade ou aperto.
Alimentar-se de forma simples e nutritiva – O corpo fragilizado precisa de energia para sustentar a jornada.
Permitir-se a pausa – Não encher o tempo de atividades para calar a dor; aprender a descansar também faz parte da cura.
Estes cuidados não eliminam a ausência, mas oferecem sustentação. Dão ao corpo a força necessária para continuar a caminhar. O luto é uma experiência integral: mexe com a mente, fere a alma e pesa no corpo. Por isso, atravessá-lo exige um olhar total, que não separe estas dimensões. Cuidar do corpo é cuidar da mente. Cuidar da mente é aliviar o corpo. E, em ambos, há espaço para o espiritual: a oração, o silêncio, os rituais que dão sentido ao que parece absurdo. Aprender a escutar o corpo no luto é também aprender a respeitar-se. É reconhecer que a dor não se supera com pressa, mas se integra passo a passo, em gestos de presença e compaixão.
O luto não é apenas uma experiência emocional: é integral, envolve corpo, mente e espírito. Reconhecer a dimensão física da perda é também validar a sua profundidade e dar dignidade ao processo. Quando a dor pesa no corpo, cuidar dele torna-se uma forma de cuidar da alma. E assim, passo a passo, corpo e coração encontram juntos a possibilidade de continuar a viver.