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OS DIAS DA SEMANA Museus e festarolas

 

 


 


 

Quem hoje viajar pelo país descobrirá museus de assinalável relevância. Mesmo em municípios de pequena dimensão podem, inesperadamente, surgir museus qualificados, de natureza variada, dedicados, por exemplo, a um género de objectos – amiúde, colecções de uma vida –, a um ofício, a uma indústria, a um período histórico, a uma área da ciência. Cumprem, de um modo geral, uma missão que não se esgota, como uma festarola, na espuma dos dias.

Um dos museus mais recentes localiza-se em Abrantes, onde há poucos meses foi inaugurado o Museu de Arte Contemporânea Charters de Almeida, um escultor nascido em Lisboa em 1935. O museu, que acolhe uma doação do artista e da sua família, fica junto ao castelo, num dos edifícios mais conhecidos da cidade, inicialmente uma casa de habitação, construída em 1897, depois, propriedade da Câmara Municipal desde 1956, Escola Industrial e Comercial e, seguidamente, diversas outras coisas. Após uma conseguida obra de recuperação, aliás, devidamente documentada na sala de exposições temporárias, fica a albergar a obra de João Charters de Almeida. Múltiplos trabalhos seus são sobejamente conhecidos, ainda que a autoria seja, talvez, desconhecida de muitos. É o caso dos cinco painéis de azulejos criados para o edifício da sede da Fundação Cupertino de Miranda, em Vila Nova de Famalicão (1971) e dos painéis de azulejos feitos para o edifício da sede do Jornal de Notícias, no Porto (1973). Dez anos antes, tinha concebido para o Mosteiro de Singeverga “Cristo Ego Sum Resurrectio et Vita”.

Em Vila Nova de Famalicão, próxima do edifício da Fundação Cupertino de Miranda, encontra-se também, desde Outubro de 2023, a escultura “Jardim Suspenso”, apresentada como sendo a última obra de arte que João Charters de Almeida concebe para o espaço público, culminando um percurso que passou pela Bélgica, o Canadá, os Estados Unidos da América e o Japão, países onde se podem encontrar esculturas com até 40 metros de altura; além de Portugal, onde o trabalho considerado como o mais emblemático é o conjunto escultórico vermelho que se apresenta como pórtico na Alameda da Universidade de Lisboa.

A lista de museus que o país deve a Câmaras Municipais é longa e, para dar exemplos variados, pode incluir o Museu de Arte Contemporânea Nadir Afonso, em Chaves; o Museu da Oliveira e do Azeite, em Mirandela; o Museu de Cinema de Melgaço – Jean-Loup Passek; o Espaço Miguel Torga, em S. Martinho de Anta, Sabrosa; o Museu da Memória de Matosinhos; o Museu Marítimo de Ílhavo; o Museu das Duas Rodas, na Anadia; o Museu do Neo-Realismo, em Vila Franca de Xira; ou o Museu – A Estação – Pinhal Novo, em Palmela.

Os exemplos de museus que procuram cumprir objectivos distintos, de um modo mais ou menos ambicioso, com ou sem serviços educativos, são geralmente admiráveis. Preservam e divulgam o património, estimulando o seu estudo. Podem ser também, como frequentemente são, pólos de dinamização cultural, centros de artes, laboratórios de criação, fomentadores de uma cidadania crítica e participativa.

O número de pessoas que visitarão museus fora de Lisboa ou do Porto não excederá o das que acorrem a grandes festividades de fim-de-semana (sobretudo se o número dos que nela participam for sobreavaliado – revelando, aliás, como tantas vezes nos é dado a assistir, formas de contabilização delirantes), que, em várias localidades, estão para a cultura como o eucalipto para a floresta.
Mas não seria necessário prescindir de gastar dinheiro em entretenimento e na sua popularização televisiva para que, ao fim de uma dúzia de anos, uma câmara municipal pudesse ser capaz de oferecer aos cidadãos pelo menos um museu apreciável com o abundante material de que facilmente pode dispor.

Em Braga, a autarquia não apenas não inaugurou qualquer museu, como nem sequer conseguiu terminar o mandato tendo de portas abertas aquilo que herdara da anterior maioria: a Casa dos Crivos e o Museu da Imagem. Verificar que, no coração da cidade, o que outrora foi uma simples placa com informação sobre a Torre de Menagem, também ela encerrada, permanece em escombros há pelo menos três anos é suficiente para se compreender o nível de desinteresse pelo património cultural e de indiferença pela memória colectiva.

Eduardo Jorge Madureira Lopes

Eduardo Jorge Madureira Lopes

14 setembro 2025