Era assim que lhe chamava o programa: Encantos da Índia. A viagem foi promovida pelo Padre Dayakar Reddy Thumma, natural do estado indiano de Andhra Pradesh1 e Pároco no arciprestado de Vila Verde, a quem, desde já, agradecemos a mestria, a paciência e a dedicação com que conduziu o grupo. A referida viagem levou-nos a comprovar que a Índia é um encanto, apesar de termos visitado apenas alguns dos seus encantos.
Partimos a meio da manhã do dia 20 de agosto, em voo do Porto para Istambul e, ao fim do dia, de Istambul para Nova Deli, onde chegámos ao amanhecer do dia seguinte2. Apenas fomos ao hotel para repousar um pouco e seguimos, de imediato, para a visita à cidade que, com mais de 22 milhões de pessoas, é umas das mais populosas e fervilhantes do mundo. Aí, pudemos comprovar que é possível alguma ordem na desordem, algum silêncio na poluição sonora e alguma beleza no meio de tanto lixo disperso e acumulado.
Na parte antiga da cidade, tirámos os sapatos e visitámos a mesquita Jama Masjid, uma cópia da de Meca, com as suas impressionantes cúpulas de mármore e minaretes de arenito. Construída entre 1644 e 1656, o seu pátio alberga até 25000 pessoas, tornando-a a maior de toda a Índia. No fim dessa visita, fizemos um passeio de rickshaw3 pelas ruas estreitas de Chandni Chowk, umas das mais movimentadas áreas comerciais e turísticas da cidade. Finda essa barulhenta e turbulenta aventura, mergulhámos no silêncio e na beleza do Raj Ghat, local onde Mahatma Ganhi foi cremado, a 31 de janeiro de 1948, e onde arde uma chama eterna4. É esse um dos mais fortes símbolos da moderna nação indiana.
Da parte da tarde, cansados, acalorados e molhados, visitámos a parte nova da cidade, construída pelos britânicos, entre 1930 e 1940, com especial destaque para a Porta da Índia, erigida em memória dos soldados indianos que morreram ao serviço do exército britânico. Na direção oposta, encontra-se Rashtrapati Bhawan, outrora residência do vice-rei britânico e atualmente residência oficial do Presidente da Índia. No cimo dessa avenida, está o parlamento indiano, o enclave diplomático e o Qutub que, com os seus 72 metros de altura, é o mais elevado minarete isolado de toda a Índia. No limite do esforço, ainda fomos ver o belíssimo túmulo de Humayun, mandado construir pela sua esposa Haji Begum, em 1565. Diz a lenda que o Taj Mahal foi nele inspirado e há quem defenda que o iguala ou até o supera, em beleza.
Na manhã do dia 22 de agosto, partimos para a cidade de Agra que, com a chegada dos Mongóis, em 1526, liderados por Babur, ganhou proeminência em quase toda a Índia, vindo a atingir o auge entre 1556 e 1658, sob a liderança dos Shah Jahan e Jehangir. Durante o reinado de Akbar, Agra tornou-se um centro de arte, de comércio e de cultura.
Pela tarde, visitámos o Forte Vermelho5, situado nas margens do Yamuna, um dos três rios sagrados do hinduísmo6. Trata-se de um conjunto arquitetónico de palácio, fortaleza e mesquita, construído em 1565, por ordem do imperador Akbar, e sucessivamente ampliado, com inúmeras histórias românticas e dramáticas. O dia terminou com a visita ao túmulo de Itmad-ud-Daulah, pai da rainha Nur Jehan. Com dois andares, a sua beleza advém-lhe da arquitetura e dos mosaicos incrustados de pedras semipreciosas.
Foi ainda em Agra que, no dia seguinte, de manhã muito cedo, visitámos o Taj Mahal (Palácio da coroa), uma das novas Sete Maravilhas do Mundo, classificado pela UNESCO como património da humanidade e um dos maiores encantos da Índia. Foi construído por Shah Jahan, em memória da sua esposa, a Imperatriz Mumtaz Mahal, que o acompanhava sempre nas campanhas militares e morrera durante um dos seus combates. A construção deste mausoléu ocupou mais de 20000 artesãos e demorou cerca de 22 anos (1632-1653). Construído em mármore e incrustado de pedras semipreciosas, tornou-se um dos mais eloquentes símbolos do amor imortalizado.
Na manhã desse dia, visitámos Fatehpur Sikri, também ela classificada pela UNESCO como Património da Humanidade, em virtude do seu imponente conjunto arquitetónico que funde o estilo islâmico, hindu e cristão. Construída em 1569, pelo imperador Akbar, foi capital mongol durante 15 anos, mas acabou por ser abandonada, devido à falta de chuva.
Concluídas essas visitas, era tempo de rumar a Jaipur, a cidade cor-de-rosa, capital da Rajastão e lendária terra dos Marajás. Porque o espaço nos falta e a paciência do leitor tem limites, dela, de Goa e de Bombaim nos ocuparemos na próxima crónica.
1 Este estado da Índia Meridional, com a capital Amaravati, vive sobretudo da agricultura (arroz, cana de açúcar, algodão e tabaco). Mais recentemente, instalaram-se aí indústrias de tecnologia de informação e de biotecnologia.
2 Em relação a Portugal, a diferença horária é de 4 horas e 30 minutos.
3 Modo de transporte muito usado na Ásia, era originalmente um veículo puxado por uma pessoa a pé. O termo aplica-se também a uma bicicleta ou veículo motorizado que puxa uma estrutura anexa, com bancos para passageiros. Entre nós, está a divulgar-se uma versão muito parecida com o rickshaw motorizado, o tuk-tuk.
4 O memorial abriga também os restos mortais de outros importantes líderes indianos e está localizado nas margens do rio Yamuna.
5 Esta coloração tem a ver com a rocha de que é feito, o arenito.
6 Este rio, considerado uma deusa, é afluente do Ganges. Tem uma grande importância religiosa, especialmente na região de Mathura e Vrindavan. O mais sagrado, porém, é o rio Ganges. Considerado uma deusa, acredita-se que suas águas purificam os pecados e ajudam na libertação do ciclo de renascimentos (moksha). É especialmente venerado na cidade de Varanasi. Também sagrado, mas mítico e mencionado nos Vedas, é o rio Sarasvati. Crê-se que tenha desaparecido, mas a sua importância espiritual permanece. Tem o nome da deusa hindu do conhecimento, da sabedoria, da música, das artes e da aprendizagem: Sarasvati.