É um problema geral em toda a Europa, todavia mais agudo nalguns países como sucede em Portugal. Refiro-me ao progressivo esclerosamento das taxas de natalidade e de fecundidade nos países europeus, donde resultam sérias ameaças para a preservação do celebrado “estado social europeu”, dependente da manutenção de um sustentado crescimento económico.
É certo que outros fatores, que não só a natalidade e a fertilidade, se insinuam relevantes para economia e, consequentemente, para o estado social na Europa dos anos próximos. A elevação dos orçamentos militares europeus, para evitar novas aventuras de Moscovo para lá da Ucrânia, a agressividade competitiva da China, agora num patamar tecnológico superior, e a reformatação dos fluxos comerciais com a nova América Trumpiana constituem-se nos principais desafios. Ao invés, a IA (inteligência artificial), para a qual a Europa parece partir com algum atraso, pode ajudar, mas não dispensa tradicionais contributos, como sejam uma mão de obra bastante.
Voltemos à demografia portuguesa e europeia, com base em dados de 2022 a 2024, anos recentes.
Na Europa, a distribuição geográfica dos indicadores mais favoráveis na fecundidade, ainda que curtos (generalizadamente abaixo dos 2,1 filhos por mulher), reflete os valores culturais e religiosos da população – o islamismo relevante em países como a Bulgária, a Turquia e a França ou o catolicismo mais pujante na Irlanda –, a generosidade dos apoios à maternidade/paternidade (Suécia e Dinamarca destacam-se) e ainda a segurança e a qualidade no emprego (flexibilidade e remuneração).
Em Portugal, o Parlamento prepara-se, entretanto, para debater – ou rebater – propostas governamentais relativas ao código de trabalho e aos apoios à maternidade/paternidade. Alegadamente, o foco das intenções do governo será favorecer o incremento da produtividade empresarial, sem o que – argumenta-se, justamente – não será possível aumentar o rendimento médio dos portugueses e, consequentemente, melhorar a sua qualidade de vida. De todo o modo, as eventuais alterações a acertar têm de ser inteligentes.
Não sendo Portugal o país da UE com legislação menos amigável para com a maternidade/paternidade (e consultei a IA, caro leitor, para chegar a esta conclusão, que espero acertada), não é também, ao presente, um dos cimeiros no que se refere a benefícios concedidos aos progenitores. Restringir os direitos dos pais aquando do nascimento de um filho ou no apoio ao longo da infância pode insinuar-se vantajoso, no curto prazo, para a produtividade empresarial. Todavia, no médio/longo prazo deverá redundar num decréscimo das já débeis taxas de natalidade e de fecundidade nacionais. E numa sociedade portuguesa futura progressivamente envelhecida será mais difícil preservar um generoso estado social – que todos almejamos –, o crescimento económico e a criatividade tenderão a esmorecer, e a vida social, marcada mais pelo outono dos idosos do que pela primavera da juventude, tenderá a ser menos bela, menos prometedora e ridente.
É um dado histórico adquirido que o desenvolvimento dos países emparelha com a tendencial retração da natalidade (mercê, desde logo, pelo comum acesso da mulher ao mercado de trabalho e ainda pela desvinculação, cultural, da maternidade como incontornável marca identitária da feminilidade).
Não há receitas milagrosas para incrementar a natalidade (veja-se o caso do próspero Japão, que quase recusa replicar-se) e é muito difícil reverter políticas antinatalistas, como sucede na China atual (depois de décadas da política repressiva a favor do filho único, os chineses ignoram agora a liberdade de ter mais filhos).
E mais, em Portugal não se pode pretender regulamentar a imigração, como defende o atual governo – travando a política de portas quase abertas, antes prevalecente –, o que se bem gizado defende os interesses do país e o dos próprios imigrantes já instalados, e simultaneamente adotar outras medidas que ameacem a nossa demografia futura, a economia e o estado social.