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A “lenda das virtudes”

Segundo reza uma lenda antiga, quando Deus criou o mundo decidiu conceder à humanidade duas “virtudes”, para que prosperasse. E assim fez: aos suíços deu-lhes o estudo e o respeito; aos ingleses, serem organizados e pontuais; aos argentinos, chatos e arrogantes; aos japoneses, o trabalho e a disciplina; aos italianos, a alegria e o romance; aos franceses, a cultura e o charme; aos portugueses, as de inteligentes, honestos e políticos. Ficando, com três, em vez de duas, mas sob o olhar desconfiado dos outros povos.

O que levou um ousado um anjo a questionar o Criador sobre se seria boa ideia ter beneficiado os portugueses com mais uma “virtude”. Pois poderia ser perigoso, caso se tornassem demasiado soberbos. Ao que Ele lhe respondeu: “o teu reparo é pertinaz, vou corrigir a minha dádiva. Assim, o que for político não pode ser inteligente; o político que for inteligente não pode ser honesto; o que for inteligente e honesto não pode ser político”. Vejamos, então, como estes se vêm comportando.

O primeiro “dom” luso, se é que assim se pode chamar, é o que mais tem surgido ao longo dos anos. Isto, porque só temos tido políticos de inteligência mediana, ou seja, sem dois dedos de testa. Os quais, não fosse a política não tinham para onde ir, nem se conseguiriam realizar social e profissionalmente. Não havendo quem os quisesse dentro de portas? 

Ademais, fazem-se de inteligentes para serem governantes, mas não atingem que podem estar a ser investigados sempre que se metem em esquemas e negociatas, ao ponto de esconderem dinheiro vivo nos gabinetes. Importâncias, vindas de fora dos corredores do poder através de amigalhaços (testas de ferro), provenientes dos cofres públicos, a bem da vidinha deles do mandante. 

Já o segundo “talento”, tem a ver com o político que se acha mesmo inteligente, a tal ponto de pensar que é o maior, que tudo pode e só ele é que sabe. Só que se por um lado está confiante na capacidade dos seus neurónios, por outro deixa-se facilmente embalar pelo canto da sereia. Ou seja, tenderá a servir a desonestidade por sentir que é capaz de dar a volta ao texto, enganar de paleio os papalvos dos governados e, que se lixem, aproveitar ficar bem na vida financeiramente. Basta fazermos uma ronda pelos organismos judiciais M. P. e P. J. para constatarmos o quão encharcados estão de casos e casinhos de várias personagens, ditas inteligentes.

Daí, o não serem inteligentes para poderem ser políticos. Porque se o fossem não se deixavam apanhar pelas novas tecnologias em escutas sobre o crime económico-financeiro, a fim de rapidamente enriquecerem. Porque eles sabem como atirar com areia para os olhos do povo quando dizem estar sempre de consciência tranquila. Paz essa, que lhes advém do facto da Justiça atuar quase só para o cidadão comum. 

Quanto à terceira “capacidade”, a dos inteligentes e honestos – que, se o forem, jamais poderão ser políticos – esses recusam embrenhar-se no sistema lobista, no clientelismo e na corrupção que graça na esfera da política portuguesa. Mas será que alguém com tais predicados e no seu perfeito juízo, se quer sujeitar a governar o país, para logo começar a ser queimado em lume brando não só pelos partidos da oposição, como pelos média? 

Se há por cá gente com estaleca para tal? Claro que sim, mas ao ver os cenários que lhe passam diante dos olhos, nem pensar entrar na política. Senão, veja-se o que aconteceu a um ex-governante (2011/2015) que se viu não só arredado do poder por um chico-esperto, como achincalhado, vilipendiado e, ainda hoje, carrega os anátemas lançados à sua governação, apesar de ter salvo o país da bancarrota. 

Portugal, nestes 51 anos de democracia, tem sido a capoeira da “galinha dos ovos d’ouro” para algumas raposas da política nacional. É por isso que as sondagens têm vindo a dar primazia a um Presidente da República oriundo das hostes militares. Talvez para, como sentinela, ter conta na produção da ovípara ave lusitana. 

Narciso Mendes

Narciso Mendes

28 julho 2025