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Como travar o ódio?

Como parar uma guerra se não somos capazes de travar o ódio? Como avançar nas negociações se não conseguimos irenizar os corações?

Acresce que, ao contrário das suas vítimas, o ódio é incomensurável. Podemos contabilizar os mortos e os feridos, mas o ódio (que os mata e fere) é impossível de medir. Só sabemos que está a crescer, assustadoramente a crescer.

Como percebeu notavelmente Gonçalo M. Tavares, «a produção do ódio é hoje uma das mais rápidas e funcionais actividades. E é um fazer já não artesanal, mas industrial».

As ferramentas do ódio são terrivelmente poderosas. Colhem efeitos devastadores numa parcela ínfima de tempo.

Desvanecemo-nos com a revolução tecnológica, que nos faz presumir imortais, mas que nos torna (sofregamente) letais.

Esquecemo-nos dos seus limites e não prestamos a devida atenção aos seus perigos.

Mesmo a boa utilização da tecnologia o mais que permite é adiar a morte. Já a sua má utilização antecipa – e apressa – a própria morte.

É mais fácil aceder a meios para matar a vida do que para proteger os vivos. Daí que – avisa Luc de Clapiers – haja «tudo a recear do tempo e dos homens».

A contaminação da maldade afunda, assim, a bondade primordial com que o Criador nos dotou. Aliás, desde os começos, o próprio Deus reconhece que «a maldade dos homens é grande sobre a terra» (Gén 6, 5).

Como sair desta situação, em que os vencedores também perdem e os que matam também acabam – um dia – por morrer?

Bom seria se olhássemos para a «humildade criadora» de Deus, que nos confia o cuidado da Sua obra (cf. Gén 1, 28-30).

Segundo a visão do místico judaico Isaac Luria, a divindade como que se contrai numa espécie de retiro («zimzum») para hospedar o homem e o universo.

O Padre François Varillon veicula uma perspectiva semelhante. Uma vez que «cada pessoa divina não existe senão pelas outras e para as outras», Deus surge como «criador de liberdades». 

É de tal ordem a humildade divina que «as criaturas podem existir nelas mesmas e por elas mesmas». 

Deus dá-lhes até a possibilidade de serem outras sem descartar a possibilidade de se relacionarem com Ele. 

Em suma, o exercício do poder divino radica na conjugação do verbo «amar».

Amar é, ao mesmo tempo, respeitar o outro e unir-se a ele. E respeitar implica querer que o outro seja verdadeiramente ele.

É assim que Deus é o promotor da vida, da paz, da convivência, da harmonia.

A esta luz, é insustentável que se fomentem mortandades para expandir territórios. A vida de uma pessoa não é mais valiosa que uma porção de terra?

Quando é que o mundo reaprenderá a ser mundo e o homem se decidirá a ser – de uma vez para sempre – plenamente humano?

João António Pinheiro Teixeira

João António Pinheiro Teixeira

15 julho 2025