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Impacto do ’fogo de artifício’ nas mudanças climáticas


 
 



 

Não há festa nem romaria, festinha nem qualquer outra iniciativa popular de relevo que não tenha fogo de artifício, desde o mais estralejante até ao mais vistoso nas noites de arraial. Que contributo tem ou pode ter esse fogo de artifício nas mudanças climáticas? Não será tanto ou mais perigoso que o uso – em muitos casos roçando o abuso – desta arte pirotécnica pode ser mais funesto para a natureza do que o risco dos fogos florestais? Independentemente dos custos desse fogo de artifício não deveríamos estudar uma outra forma de festejar do que contribuindo para a poluição e, consequentemente, para as alterações climáticas?
 
1. Daquilo que é percetível há muitas localidades onde o ‘culto' do fogo de artifício tem foros de quase doença social: ter muitos foguetes e durante muito tempo torna-se uma forma de afirmação no contexto socioeconómico. Nalguns casos a credibilidade da festa – mesmo naquilo que à comissão teve de relevo, boa reputação e mesmo desempenho – mede-se pela quantidade de foguetório. Noutros casos – quase terceiro-mundistas – o fogo de artifício é o número da procissão – dita religiosa – mais desejado e central. Quando as festas ocorrem em maré de fogos florestais – com a possibilidade de não haver foguetes, na quantidade exigível – questiona-se a boa execução da comissão de festas (civil ou religiosa) e muito mais do que outros aspetos relegados para plano secundário.
 
2. Se atendermos aos gastos em fogo de artifício, ele ocupará boa percentagem das despesas totais globais. Se medíssemos a comparação com outros itens da festa, o fogo de artificio deverá ser um dos pontos de maior investimento. Ai de quem tente questionar tal cultura… De facto, a arte da pirotecnia é interessante e tem vindo a ser valorizada, com novos elementos. Será que a anexação de música à exibição dos artefactos ajuda a ler a mensagem de cor e de ritmo? Não será preciso algo mais do colocar todos de olhar nos céus sem descodificar a mensagem comunicada? É tempo de sair de uma certa ignorância generalizada…
 
3, Naquilo que às festas religiosas diz respeito, quem ousaria equiparar os gastos do fogo de artifício com as despesas dos atos de culto? É uma velha e desgastada luta, onde o elo mais fraco é a entidade que dá cobertura ao episódio de ser uma festa em ‘honra de… (santo, Nossa Senhora, etc)’, mas sob a desonra de tal. Não conheço totalmente as lutas para equilibrar tais comparações, mas que se deviam colocar critérios para ambas, claramente. Não acontecerá de queimarmos os donativos dos que ajudam a fazer a festa com artefactos de sonoridade irritante e com proveito duvidoso, a não ser para as empresas de pirotecnia? Quem incluiria um por cento que fosse para os tais ‘atos religiosos’ (material de evangelização, novena, celebrações litúrgicas, procissão com material explicativo dos elementos religiosos integrantes na mesma) sem isso ser escândalo, mas necessidade? Talvez tenhamos de aproveitar as festas (pretensamente) religiosas para ainda cativarmos para a fé celebrada tantos que não a têm (minimamente) esclarecida…
 
4. No entanto, alguns dizendo-se defensores das questões da natureza não se pronunciam ainda sobre esta matéria, podendo levar uma reprimenda social sobre tal questionamento básico sem ser fundamentalista. Tentemos abordar a temática e correlação do fogo de artifício com as mudanças climáticas. Estas são cada vez mais nítidas e sentidas no nosso dia-a-dia…
Desde logo o impacto dos fogos de artifício é de natureza sonora/acústica e de poluição atmosférica. Como poluição sonora, a queima de fogos de artifícios causa aos animais reações comportamentais como stresse e ansiedade. Como na maioria das vezes, os fogos de artifício são utilizados no período noturno, os efeitos causados aos animais (principalmente nos silvestres) são difíceis de serem percebidos e quantificados, o que indica que os impactos nocivos dessa atividade nos animais não são tão clara e rapidamente notados… Um certo romantismo dos fogos de artifício é posto em causa pelas consequências que produz.
 
5. Não está em causa o direito (social e individual) à diversão, mas possivelmente o perigo para a saúde pública das populações, mesmo sem disso nos darmos conta de imediato. Colocar o problema não ofende!



 

António Sílvio Couto

António Sílvio Couto

14 julho 2025