A partir da última década de 70, os Institutos Superiores de Educação Física (ISEFs) de Lisboa e Porto, com outras designações na sua origem, tornaram-se verdadeiros berços de excelência na formação técnico-pedagógica em Educação Física e do Desporto. Com uma forte ligação à prática, formavam professores, treinadores, técnicos e pensadores que rapidamente se afirmavam no panorama desportivo nacional, assim como, a nível internacional.
Os docentes dessas instituições eram figuras públicas, respeitadas e conhecidas, com vasta experiência acumulada nos ginásios, pavilhões e outros “terrenos” da prática desportiva. Era comum vê-los nos grandes palcos do desporto e na televisão, a orientar equipas de topo ou seleções nacionais. Eram mestres com autoridade, tanto no “jogo” como na teoria, reconhecidos pelas suas contribuições concretas ao desporto.
Com a entrada em vigor da Lei da Autonomia das Universidades, já perto dos anos 90, os ISEFs transformaram-se em Faculdades, e entretanto aparecerem mais Instituições de Ensino Superior Universitárias e Politécnicas a oferecer formação na área e iniciou-se uma lenta mutação. A lógica da progressão académica, centrada na produção científica e na publicação de artigos em revistas internacionais, afastou gradualmente a componente técnica e prática do ensino. Os professores-pedagogos deram lugar a professores-cientistas, mais preocupados com a sua carreira académica individual do que com o impacto real da sua atividade no terreno e na sociedade. Ainda assim, importa reconhecer que continuam a existir alguns docentes nas suas instituições, comprometidos com a realidade desportiva nacional.
No entanto, hoje, as instituições de ensino superior que outrora preparavam quadros para escolas, clubes, federações, autarquias, etc., formam, em grande parte, perfis de estudantes com conhecimento eminentemente académicos e cujo principal objetivo dos Docentes, é quase sempre, como referido anteriormente, publicar, para garantir a progressão na carreira. O resultado é uma rutura preocupante entre o ensino superior e os agentes de desenvolvimento desportivo. Alunos, treinadores, clubes e federações já não reconhecem nas instituições de ensino superior os polos de referência do ensino técnico que foram no passado. E muitos dos seus docentes tornaram-se ilustres desconhecidos para a comunidade desportiva.
As perguntas inevitáveis são: qual é, hoje, a mais-valia social destas instituições junto das instituições desportivas? Que impacto real têm na formação de treinadores, nas políticas públicas, no apoio técnico às escolas, clubes, federações ou autarquias? De que servem os “papers” que quase ninguém lê, quando os desafios do desenvolvimento desportivo exigem competência aplicada, conhecimento do terreno e capacidade de intervenção real?
Esta desconexão entre academia e prática poderá mesmo ser uma das causas do fraco índice de prática desportiva em Portugal e dos resultados nas grandes competições internacionais, incluindo os Jogos Olímpicos. Repensar a missão do ensino superior do desporto parece complexa, mas há certamente espaço para revalorizar o conhecimento técnico e incluir o impacto social como critério de avaliação institucional e docente como um passo necessário para devolver às universidades e politécnicos um papel ativo e transformador. O desporto português precisa de instituições de ensino superior verdadeiramente comprometidas com o terreno, e com o país, que não esqueceram o desporto, e sabemos que temos países que não deixaram de fazer este investimento, e cujos resultados são verdadeiramente expressivos.