1. Releio no evangelho de S. Lucas (16, 19-31) a parábola do pobre Lázaro e do rico avarento.
Vejo nela o convite a uma reflexão sobre o uso da riqueza; a condenação do seu uso egoísta. Mostra como aquela pode ser um obstáculo à entrada no Reino de Deus e como os critérios das Bem-aventuranças se opõem aos critérios do mundo.
Mal usada, a riqueza pode levar ao esquecimento de Deus e dos outros.
Mesmo não sendo rico, que cada um pense no uso que faz do dinheiro que lhe passa pela mão: em que o gasta, como o gasta, em proveito de quem.
2. Viver para o dinheiro tem como consequência a dureza, o isolamento, a incredulidade. Quem abre o coração ao dinheiro fecha-o aos irmãos.
Mal usada, a riqueza torna o homem insensível aos problemas alheios.
Leva ao esquecimento dos pobres e do dever praticar as obras de misericórdia: dar de comer a quem tem fome, dar de beber a quem tem sede, vestir os nus, ensinar os ignorantes… (Mateus 25, 14-30).
3. O dinheiro tem uma função social: servir a quem o possui e aos outros. Contribuir para que cada um seja mais homem e melhor filho de Deus e ajude os outros a serem-no também.
Ninguém se julgue dono, mas administrador dos bens que diz possuir.
O dinheiro deve ser meio e não fim. Meio para adquirir bens de ordem superior. O ideal do ser humano não deve consistir em ter mas em ser.
4. Há quem não goste que o diga mas a verdade é que Deus criou o mundo para todos e não para um grupo de privilegiados (Papa Francisco, «A Esperança não engana», 16). É Sua vontade que a ninguém falte o necessário. Quem tem muito deve saber repartir com quem não possui o indispensável para viver com dignidade.
5. «O supérfluo dos ricos é propriedade dos pobres», afirmou Santo Agostinho (354-430).
S. Basílio, Bispo do séc. IV (329-379), disse:
«Pertence ao que tem fome o pão que arrecadas. Ao que está nu, o casaco que arrumas nos teus armários. Ao que anda descalço, os sapatos que abolorecem em tua casa. Ao pobre, o dinheiro que tens escondido. Cometes tantas injustiças quantas as pessoas a quem os podias dar.
Se tens três pares de sapatos e dás um ao mendigo que vai descalço, não digas que lhe dás um par de sapatos, diz que lho devolves, porque lhe pertence».
A ninguém deveria ser permitido gastar em luxo quando a outros falta o indispensável.
Como posso ter carros de centenas de milhares de euros enquanto o meu vizinho não tem o suficiente para o passe do autocarro? Como se podem gastar fortunas num banquete enquanto ao lado há quem passe fome? Porquê gastar centenas de euros num vestido de noiva, que se usa uma vez na vida, quando o vizinho tem dificuldade em mudar de camisa? Como é possível haver luxuosas casas de férias quando há casais jovens forçados a viverem com os progenitores?
6. A parábola é também convite a que pensemos nos lázaros de hoje: os que precisam do nosso dinheiro, do nosso carinho, da nossa companhia, de uma nossa visita, do nosso sorriso, de uma palavra de encorajamento.
No ambiente em que vivemos podem coexistir pobres lázaros e ricos avarentos.
Há filhos que são lázaros à espera de um bocadinho de tempo dos pais. Há esposas que são lázaros à espera de um bocadinho de companhia dos maridos. Há maridos que são lázaros à espera de um gesto de carinho das esposas. Há pais que são lázaros despertos ao longo da noite, à espera que o filho ou a filha entrem em casa.
7. É Lázaro um aprendiz que necessita da compreensão e da ajuda de profissionais experimentados. São lázaros meninos com dificuldades de aprendizagem cujos pais não têm dinheiro para pagar a um explicador. São lázaros pessoas que não têm dinheiro para ir ao médico, para comprar medicamentos, para pagar a renda ou a prestação da casa.
São lázaros, hoje, doentes que passam horas e horas na Urgência de um hospital à espera de serem atendidos. Doentes e/ou idosos dependentes, a mendigarem apoios que nem sempre chegam. Idosos de modestos recursos à espera de vaga num lar...