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O remédio de Trump

Com a pose dominante que o caracteriza, entreabrindo a porta da sua zona reservada do Air Force One, para um encenado diálogo “improvisado” com os jornalistas, depois de apelidar de estúpida uma pergunta que lhe fizeram, o presidente Donald Trump voltou, este domingo, a sair em defesa das tarifas comerciais, dizendo que são um “remédio” que vai ajudar a curar a economia dos Estados Unidos da América e a solução para os seus défices financeiros crónicos.

Donald Trump anunciou a 2 de abril tarifas alfandegárias, que intitula de recíprocas, sobre praticamente todos os seus parceiros comerciais, numa ação a que chamou "dia da libertação". O patrão da Casa Branca anunciou uma tarifa universal de 10% sobre todas as importações, a acrescer às que já existiam, que entrou em vigor no passado sábado, bem como tarifas mais elevadas sobre alguns países, que começaram a vigorar a partir de 9 de abril, sob o argumento que se tratam de países considerados particularmente hostis ao comércio livre, nomeadamente os que têm excedentes comerciais significativos com os Estados Unidos., apresentando tarifas totais de 54% para a China, 20% para a União Europeia (UE), 46% para o Vietname e +24% para o Japão, numa lista que inclui cerca de 80 países e territórios.

Enquanto (só) os seus apaniguados defendem a bondade das medidas, a Federal Reserve (FED) – o sistema de Bancos Centrais dos Estados Unidos – órgão independente da administração norte-americana e responsável pelo estabelecimento da política monetária, pela voz do seu presidente Jerome Powell, apontou que as novas tarifas do deverão acelerar a inflação e abrandar o crescimento económico, sendo que o foco da FED será manter os aumentos de preços temporários, resistindo à pressão de Trump para baixar a taxa de juros.

Os efeitos imediatos nos mercados de capitais internacionais foram imediatos, com as quedas dramáticas em sessões consecutivas das Bolsas, incluindo as ações que compõem o Dow Jones e as Tecnológicas americanas. Reina a incerteza.

A doutrina Trump tem um princípio teórico básico: ter superavits com todos os países como quem se relaciona comercialmente ou no mínimo, equilíbrios paritários. A tese, em si, nada tem de imoral, inético ou irrazoável, aliás, não há nação que não preferisse ter superavit a déficit com a generalidade dos seus parceiros comerciais. Só que isso é impossível na prática, haverá sempre países com quem outro terá déficits e este terá outros com quem terá superavits. O que um país terá de procurar é o equilíbrio é na sua globalidade transacional.

O mais grave é que a doutrina Trump não causará o crescimento da economia americana, pelo contrário, verá a sua economia decrescer atendendo a que os parceiros atuarão ao abrigo do princípio da reciprocidade, ou seja, vão elevar na mesma medida as tarifas de importação de produtos norte-americanos, que assim virão diminuir as suas vendas – veja-se a forte queda de vendas na Europa dos veículos Tesla, propriedade do seu conselheiro preferido Elon Musk. O que sucederá é uma redução significativa no crescimento do PIB mundial, ou seja, todos nós, europeus, asiáticos, norte-americanos, africanos, vamos caminhar no seu sentido de menor riqueza e de maior pobreza. Ora, uma política de terra queimada, em que todos saímos a perder, é inética e irrazoável.

A União Europeia terá de dar uma resposta decidida, unida e adequada. O Grupo de Estudos Políticos publicou recentemente um artigo, refletindo sobre como a Europa deve responder à guerra económica de Trump, através de uma estratégia de dissuasão económica europeia. Mas o protecionismo como um impedimento, por mais forte que seja, não será eficaz para solucionar esta guerra económica. A Europa deve também retomar o controlo do debate global. A resposta pode ser construída em três etapas, uma nova estrutura macroeconómica para implementar um programa de competitividade e reindustrialização, um novo pacto com países emergentes e um renovado Acordo Plaza com a China e os EUA que atue sobre os desequilíbrios globais e o desalinhamento da taxa de câmbio. A Europa tem que apostar forte no desenvolvimento da IA e recuperar o controle dos fluxos globais de capital, para responder a esta onda nacionalista americana, como o melhor caminho para evitar uma longa batalha comercial destrutiva.

Carlos Vilas Boas

Carlos Vilas Boas

10 abril 2025