Não é por mudar o Governo que mudo de ideias quanto às greves nos serviços públicos essenciais. As greves nestes serviços são uma forma de luta que atinge em primeira linha os direitos fundamentais dos cidadãos e de entre estes, em regra, os dos mais frágeis, e só secundariamente a actuação do Governo de turno.
São os cidadãos, na verdade, os primeiros a sofrer os efeitos das greves nos serviços de saúde, vendo adiar consultas, operações, tratamentos e ainda muito recentemente atendimentos de emergência.
O mesmo sucede nas greves que ocorrem nos tribunais, quando os cidadãos esperam sentenças que lhes farão justiça e que, mesmo sem greve, são já muitas vezes tardias.
E quem sofre mais as greves nos transportes públicos senão os cidadãos que precisam deles para ir para o trabalho, para uma consulta hospitalar, para fazer chegar os filhos a horas a uma escola e não têm outro meio de transporte?
E não são os cidadãos que não têm meios para colocar os filhos em boas escolas privadas os que mais são prejudicados com as greves nas escolas públicas?
Podíamos estender a lista e verificar que em todos estes e outros casos estas greves violam direitos fundamentais dos cidadãos relativos ao acesso à saúde, à justiça, à mobilidade, à educação e outros.
E por isso, o primeiro dever dos sindicatos é prever os efeitos da greve que se propõem fazer sobre os direitos dos cidadãos, só avançando com elas em último recurso.
Por isso, a segunda obrigação dos sindicatos é tornar claras e compreensíveis as suas reivindicações de modo que os cidadãos percebam que são justas e necessárias. Os cidadãos têm esse direito porque são eles o verdadeiro patrão dos grevistas.
Por sua vez, o Governo que é o gestor e não dono do dinheiro, que os grevistas exigem – e é praticamente sempre de uma forma ou outra o dinheiro que está em causa – tem a obrigação de dizer clara e detalhadamente as razões da não satisfação das reivindicações ou em que medida as podem satisfazer.
As greves nos serviços públicos essenciais não são, pois, uma mera questão entre sindicatos e Governo. Os cidadãos também contam e têm o direito de formular o seu juízo sobre elas.
Acresce que se assiste hoje a uma banalização da utilização do direito à greve na função pública que não é admissível. E muito menos quando estão em causa, repetimos, direitos fundamentais dos cidadãos.
Pior ainda, quando se avança para uma greve, sabendo-se que se põe em causa a vida das pessoas. Uma greve no INEM faz soar todas as campainhas de alarme e ninguém (Governo ou Sindicatos) pode dizer que é alheio ao que pode ocorrer no decurso das mesmas. Nenhum pode dizer que não tem culpa.